Ao longo dos últimos dias, entregadores de aplicativos realizaram greves em uma série de países exigindo condições seguras de trabalho frente à pandemia do coronavírus e um aumento dos valores das taxas de entrega, que garanta uma renda decente aos trabalhadores.
Em São Paulo, a maior cidade do Brasil, entregadores fizeram uma primeira greve na sexta-feira da semana passada, 17 de abril, que foi retomada na segunda-feira. Também em 17 de abril, centenas de entregadores em Teresina, Piauí, no nordeste do país, protestaram exigindo segurança contra os constantes assaltos que sofrem durante o trabalho – pelos quais não recebem qualquer compensação das empresas.
Essas ações ocorreram apenas um dia depois de entregadores terem realizado protestos na Espanha, denunciando as mesmas condições precárias enfrentadas pelos brasileiros. Assim como os espanhóis, os trabalhadores brasileiros percorreram as avenidas principais de suas cidades, buzinando sobre suas motos.
Nesta quarta-feira, novas manifestações aconteceram em outros países, após ter circulado uma convocação de greve internacional dos entregadores. Na Argentina houve protestos em cidades como Buenos Aires e Córdoba. Em Quito, no Equador, dezenas de entregadores da Glovo se manifestaram nas ruas e na frente do escritório da empresa sediada na Espanha.
Em todo o mundo esses trabalhadores estão submetidos à exploração brutal pelas mesmas empresas transnacionais, como Uber, Rappi, iFood e Glovo. E governos de vários países definiram seu trabalho como serviço essencial durante pandemia, sem que as empresas, entretanto, fossem obrigadas a fornecer as condições básicas para a preservação da saúde dos trabalhadores.
Entregadores que protestavam na Avenida Paulista, no centro de São Paulo, denunciaram essa situação: 'Nós somos linha de frente e não temos suporte de um álcool em gel, não recebemos máscara, não recebemos nada', afirmou um deles.
Outro entregador declarou: 'Ninguém se posiciona da mídia. A iFood não se posiciona… Não tem nenhum representante da nossa classe. A gente tá aqui todo dia ralando e se cair um motoqueiro, tem que se virar. A gente quer uma posição [da empresa].'
Os trabalhadores afirmam que as taxas de entrega repassadas pelas empresas estão cada vez menores. 'A valorização está sendo zero… Eu arrisco a minha vida pra ganhar 2, 3, 4 reais. Desse jeito não tem como trabalhar', – declarou um trabalhador deficiente, que faz entregas sobre cadeiras de rodas.
Enquanto os trabalhadores têm sua renda cada vez mais espremida e são forçados a trabalhar horas intermináveis para garantir salários de fome, as corporações transnacionais disputam ferrenhamente entre si, ávidas por fatias cada vez maiores do mercado global.
O iFood, sediado em São Paulo e com operações em outros países da América Latina, anunciou neste mês que irá se fundir com o Domicilios.com para criar uma das maiores empresas de entregas na Colômbia. Controlado por acionistas como Jorge Paulo Lemann, o homem mais rico do Brasil, o iFood disputa o mercado latino americano diretamente com a Rappi, que é sediada na Colômbia e no ano passado recebeu um investimento de US$ 1 bilhão do conglomerado japonês SoftBank.
Em meio à pandemia do coronavírus, o número de pedidos aos aplicativos aumentou no Brasil, uma vez que os restaurantes foram fechados nas principais cidades do país. Mas, numa proporção ainda maior, cresceu o número de candidatos a trabalhar como entregadores. A Rappi registrou um pico de 300% de crescimento no número de cadastros de entregadores. O iFood recebeu 175 mil novas inscrições de entregadores em março, contra 85 mil em fevereiro.
Por trás dessa explosão no número de entregadores está o desespero social crescente das massas de desempregados e subempregados no Brasil, assim como daqueles que tiveram seus salários cortados ou foram demitidos durante a pandemia. Grande parte desses trabalhadores não está conseguindo acessar o magro auxílio de R$ 600, cerca de meio salário-mínimo, decretado em caráter de emergência pelo governo brasileiro.
O presidente de extrema direita Jair Bolsonaro segue sua campanha de sabotagem a qualquer medida de contenção do coronavírus e anunciou que irá reabrir as escolas cívico-militares já no início da próxima semana, como forma de forçar uma reabertura geral das escolas e outras atividades no país. Questionado sobre a explosão das mortes por Covid-19 no Brasil, respondeu: 'não sou coveiro'.
Com a mesma indiferença às pilhas de cadáveres, os governantes dos estados e municípios brasileiros já anunciam uma reabertura da economia. O estado de São Paulo é o maior foco da doença no país, respondendo por mais de um terço do total de mortes e com taxa de mortalidade crescente. Apesar disso, o governador João Doria do PSDB, que vem sendo exaltado pela mídia e pela pseudoesquerda como um político 'razoável', anunciou a retomada 'gradual' das atividades no estado a partir de 11 de maio.
Os políticos brasileiros seguem a mesma linha dos governos burgueses ao redor do mundo, forçando um retorno prematuro ao trabalho para garantir os fluxos de lucro à oligarquia capitalista.
As greves dos entregadores de aplicativos, por outro lado, expressam uma tendência crescente de resistência da classe trabalhadora mundial à resposta da classe capitalista à pandemia do coronavírus. No Brasil, se soma à onda de greves e protestos contra as condições inseguras de trabalho, desde a revolta dos operadores de call center em março até as recentes paralisações e protestos de enfermeiros iniciados na última semana.
Esse movimento deve avançar para uma coordenação cada vez maior entre as lutas dos trabalhadores de diferentes países, adotando um programa socialista e internacionalista. As fortunas das corporações transnacionais e seus acionistas devem ser expropriadas e redirecionadas para atender os interesses da maioria da população mundial, em primeiro lugar para combater a pandemia, garantia a renda da classe trabalhadora e salvar vidas.