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Os resultados da eleição de Berlim: Um voto contra todos os partidos no governo

Publicado originalmente em 14 de fevereiro de 2023

Seria difícil encontrar uma eleição anterior na Alemanha em que o abismo entre os interesses da população e a política dos partidos do establishment fosse tão evidente quanto na reedição da eleição estadual de Berlim no domingo passado.

O principal candidato e presidente do SGP, Christoph Vandreier, falando no comício eleitoral de 4 de fevereiro na Potsdamer Platz em Berlim

O Partido Social Democrata (SPD), os Verdes e o Partido A Esquerda, que governam conjuntamente a capital da Alemanha desde 2016, perderam quase 250 mil votos desde a eleição de setembro de 2021, que foi anulada pelo Tribunal Constitucional do Estado de Berlim. O SPD perdeu 111.000 votos, o Partido A Esquerda 71.000 e os Verdes 65.000. Isso equivale a um quarto dos votos que tinham recebido anteriormente. O Partido Liberal Democrático (FDP), que governa a nível federal com o SPD e os Verdes, também perdeu 60.000 votos, quase a metade de seus eleitores. O FDP não conseguiu atingir o limite de 5% de votos e não está mais na Câmara dos Deputados.

Essas enormes perdas são apenas parciais, uma vez que aconteceram em meio ao baixo comparecimento eleitoral, de 63%, bem abaixo dos 75,4% da eleição em 2021, quando as eleições para o Parlamento Federal (Bundestag) foram realizadas no mesmo dia. Nas últimas eleições estaduais válidas em 2016, quase 67% dos eleitores compareceram às urnas.

O SPD do chanceler alemão Olaf Scholz e do prefeito de Berlim Franziska Giffey obteve 18,4% dos votos, seu pior resultado em seu antigo reduto, onde lideram o governo há 22 anos. O SPD conseguiu apenas 105 votos a mais que os Verdes e assim permaneceu como o segundo partido mais votado nesta eleição.

O único partido que recebeu mais votos que o SPD foi a União Democrata Cristã (CDU), que obteve 28,2% dos votos, 10,2 pontos percentuais a mais do que na eleição de 2021. A CDU deve este inesperado sucesso eleitoral não a sua própria popularidade, mas a sua hostilidade em relação aos outros partidos.

Todas as pesquisas de opinião relacionadas com a eleição confirmaram que quase ninguém espera que a CDU resolva os problemas urgentes de Berlim – falta de moradia e aluguéis exorbitantes, falta de professores e escolas em ruínas, infraestrutura precária e serviços públicos sobrecarregados, bem como salários baixos e pobreza generalizada.

Apenas 31% dos entrevistados acreditam que um governo estadual, conhecido como o Senado, liderado pela CDU resolveria melhor os problemas. 52% responderam negativamente à pergunta. Sobre em quem as pessoas votariam em uma eleição direta para prefeito e quão satisfeitos estavam com o trabalho político de cada candidato, Giffey obteve, respectivamente, miseráveis 32% e 36% para um candidato em exercício, à frente do candidato principal da CDU, Kai Wegner, que obteve apenas 27% e 23% das respostas.

A CDU, portanto, recebeu mais votos principalmente devido à oposição aos outros partidos. O partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD) também perdeu eleitores, principalmente devido à abstenção. Mas, em comparação com a eleição de 2021, foi capaz de melhorar ligeiramente em termos percentuais, recebendo 9,1% dos votos. Seu resultado é significativamente menor do que o de 2016, quando obteve 14,2%.

A CDU e o SPD alcançaram os maiores resultados entre os eleitores com mais de 60 anos, com a CDU obtendo 38% dos votos e o SPD 26%. Em contraste, entre os jovens de 18 a 24 anos, eles receberam apenas 12% e 11% dos votos, respectivamente. Os Verdes receberam a maior quantidade de votos nessa faixa etária, com 22%.

Das 3,7 milhões de pessoas que vivem em Berlim, pouco mais de 1,5 milhões votaram. Uma em cada cinco pessoas não pode votar porque não tem cidadania alemã, e pouco menos de um quarto se absteve. Além disso, 14% são menores de idade que ainda não podem votar. Dos eleitores, pouco menos de 14% votaram em partidos que não passaram o limite de 5% e não estão representados na Câmara dos Deputados.

A abstenção em massa e a rejeição a todos os partidos do governo são uma expressão do vasto abismo entre as políticas de guerra e austeridade social do governo, e os interesses da grande maioria da população trabalhadora. O confronto com a Rússia é amplamente odiado, assim como os cortes nos gastos com saúde e educação e as enormes perdas salariais reais.

Mesmo que ainda não esteja claro se a coalizão SPD/Verdes/A Esquerda continuará governando ou será substituída por uma coalizão CDU/SPD ou CDU/Verdes, já está claro que o novo governo vai continuar e intensificar o confronto com a classe trabalhadora.

As lutas por aumentos salariais que acompanham a inflação e condições de trabalho decentes nos hospitais, transporte público local e coleta de lixo, que levaram a numerosas greves e protestos durante a campanha eleitoral, chegarão a um ponto alto. Isso vale também para a luta pela moradia e aluguéis a preços acessíveis.

Acima de tudo, porém, a guerra por procuração que a OTAN está travando contra a Rússia na Ucrânia e a escalada militar associada e o perigo de guerra nuclear estão colocando camadas cada vez mais amplas da população em conflito com os partidos no governo, todos os quais apoiam o militarismo. O principal candidato de Berlim ao Partido A Esquerda, Klaus Lederer, defendeu explicitamente o fornecimento de armas à Ucrânia e atacou os opositores da guerra.

Isso reforça o significado da campanha eleitoral do Sozialistische Gleichheitspartei (SGP – Partido Socialista pela Igualdade). O SGP foi o único partido a colocar a luta contra a guerra no centro de sua campanha eleitoral, vinculando-a a um programa socialista para mobilizar a classe trabalhadora internacional.

O SGP mais do que duplicou seus votos, apesar de um boicote total por parte da mídia, alcançando 801 votos. Mais importante ainda, o partido alcançou dezenas de milhares com seus comícios, manifesto eleitoral, panfletos e vídeos, e contrapôs o belicismo da elite dominante com a perspectiva do socialismo internacional. Em sua declaração eleitoral, o SGP escreveu:

A única força social que pode evitar outra guerra mundial é a classe trabalhadora internacional – ou seja, a grande maioria da população mundial, que é agora maior e mais interligada do que nunca. O SGP, juntamente com seus partidos irmãos na Quarta Internacional, está construindo um movimento socialista mundial contra a guerra e sua origem, o capitalismo. A guerra não pode ser detida sem quebrar o poder dos bancos e corporações e colocá-los sob controle democrático.

Essa perspectiva assume agora uma importância decisiva. Globalmente e em toda a Europa – da França ao Reino Unido, da Espanha à Alemanha –, a maior onda de lutas de classe desde os anos 1970 está se desenvolvendo, colocando milhões de trabalhadores em conflito com o sistema capitalista.

A campanha eleitoral do SGP enviou um importante sinal para orientar essas lutas numa direção socialista, quebrar a influência dos sindicatos e partidos políticos que os estão impedindo de avançar e os vendendo, e combinar a luta pelos direitos dos trabalhadores com a luta contra a guerra.

Esse trabalho deve ser continuado e aprofundado após as eleições. Ele coincide cada vez mais com as experiências dos trabalhadores e da juventude, que reconhecem que não podem defender seus salários e empregos, nem deter a guerra ou impedir a destruição do meio ambiente, exercendo pressão sobre os que estão no poder. Ao contrário, eles exigem uma perspectiva independente. A tarefa central é a construção do SGP como um novo partido de massas da classe trabalhadora. A campanha eleitoral lançou uma base importante nesse sentido.