Português
Perspectivas

A “Fortaleza Americana” fascista de Trump

Publicado originalmente em inglês em 5 de março de 2025

O discurso de Donald Trump no Congresso na noite de 4 de março assemelhou-se mais aos grunhidos de um aspirante a Führer do que ao discurso de um presidente, embora com um pouco menos de decoro do que um discurso de Hitler ao Reichstag alemão. O discurso foi vingativo, violento e depravado, mergulhando nas profundezas da degradação cultural e política nos Estados Unidos.

O presidente Donald Trump, à direita, chega para discursar em uma sessão conjunta do Congresso no Capitólio, em Washington, na terça-feira, 4 de março de 2025. [AP Photo/Mandel Ngan]

Todos os grupos que, em um período anterior, teriam sido identificados como pertencentes à franja fascista da política americana foram elevados ao seu centro. O gabinete de bilionários de Trump, a personificação do governo da oligarquia aplaudiu em pé cada frase, junto com os senadores e deputados republicanos, que irromperam repetidamente aos gritos de “EUA! EUA!”.

Tentar detalhar todas as mentiras que Trump proferiu seria de alguma forma dignificar seus comentários. Não foi um discurso digno de uma análise séria. Foi uma série de grunhidos de porcos e latidos de cães, com as devidas desculpas a esses mamíferos inteligentes. Foi uma combinação grotesca de reality show e espetáculo político. Trump explorou tragédias pessoais, apresentando vítimas diante das câmeras, usando-as para exigir maior violência estatal, tendo como alvo os imigrantes e outros setores da sociedade.

Por trás de tudo isso, um tema estava claro: o discurso de Trump era uma declaração de guerra – ao mundo e à classe trabalhadora. Foi uma afirmação de uma oligarquia que não irá parar por nada para manter sua riqueza e poder.

Trump delineou uma agenda de imperialismo americano irrestrito, na qual os Estados Unidos não irão estar vinculados a alianças, tratados ou leis internacionais. O discurso foi um manifesto de uma classe dominante que pretende resolver sua crescente crise econômica através da guerra comercial e da agressão militar, um caminho que leva diretamente à Terceira Guerra Mundial e ao fascismo.

Amplas medidas de guerra comercial estão no centro do nacionalismo econômico de Trump. Ele afirmou absurdamente que novas tarifas massivas dirigidas ao México, Canadá e China preservariam empregos americanos e reduziriam preços. Na realidade, essas medidas irão provocar demissões em massa e o aumento de preços.

O corolário da visão de Trump de uma “Fortaleza Americana” autossuficiente é a erupção violenta do imperialismo americano. Ele repetiu seu compromisso de retomar o Canal do Panamá, uma ameaça explícita de intervenção militar na América Latina. Trump declarou que o México – que chamou de “o território imediatamente ao sul da nossa fronteira” – estava “dominado inteiramente por cartéis criminosos”, uma justificativa mal disfarçada para a guerra. Ele reviveu chamados para que os EUA assumissem a Groenlândia “de uma forma ou de outra”.

Trump alegou que seu governo traria “um futuro mais pacífico e próspero” para o Oriente Médio – uma “paz” erguida sobre os ossos de dezenas de milhares mortos por Israel em Gaza, um genocídio totalmente apoiado por seu antecessor e agora sendo levado à sua conclusão lógica pelo próprio Trump.

O discurso estava impregnado de mentiras tendo como objetivo justificar ataques históricos contra a previdência social, subsídios na saúde (Medicare, Medicaid) e outros programas sociais, com o objetivo de empobrecer milhões enquanto entrega centenas de bilhões em cortes de impostos para os ricos.

Trump se levantou contra supostas “fraudes” na previdência, citando, em grande parte, exemplos absurdos e fabricados de supostos abusos para preparar o caminho para cortes massivos em benefícios. O objetivo era claro: esvaziar um dos últimos pilares restantes de proteção social nos Estados Unidos.

Ao mesmo tempo, Trump se gabou de suas demissões em massa de servidores públicos federais, referindo-se aos milhares de funcionários públicos eliminados sob suas ordens executivas como “burocratas não eleitos”. Ele declarou que a destruição de empregos e meios de subsistência era uma vitória para o “contribuinte americano”, apresentando demissões em massa como parte de sua campanha para “drenar o pântano”.

A ironia era inconfundível: o “burocrata não eleito” mais notável de todos, Elon Musk, o homem mais rico do mundo, estava presente com seu sorriso estúpido enquanto preside esse massacre como chefe do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE) de Trump.

Nenhuma descrição dos acontecimentos estaria completa sem incluir a absoluta covardia e cumplicidade do Partido Democrata. Enquanto Trump os denunciava repetidamente, os congressistas democratas reunidos mantinham-se sentados passivamente, vestindo camisas rosas e segurando pequenos cartazes para supostamente demonstrar sua oposição.

Mesmo quando um de seus próprios membros, o deputado Al Green, foi tirado à força da câmara por protestar contra as declarações de Trump, os democratas não fizeram nada. O fato de terem comparecido – sob instrução da liderança de seu partido – era, em si, uma declaração preventiva de covardia.

Esse espetáculo não poderia ter ocorrido sem a sua ativa colaboração. É preciso apenas apontar que o homem que estava atrás de Trump – o presidente da Câmara, Mike Johnson – foi mantido no cargo com votos democratas no ano passado como parte de um acordo para financiar a guerra dos EUA-OTAN na Ucrânia.

Milhões de pessoas que assistiram Trump falar ficaram enojadas e desgostadas. Porém, qualquer um que esperasse que o delírio fascista fosse enfrentado com uma resposta séria, em vez disso, viu-se submetido ao vazio e reacionário discurso de Elissa Slotkin, uma desconhecida cuidadosamente selecionada pelo establishment do Partido Democrata.

Slotkin, que começou proclamando suas credenciais como agente da CIA servindo sob Bush e Obama, preparou a resposta oficial do partido, colocando no centro de sua oposição a Trump não o seu ataque aos direitos democráticos ou contra os trabalhadores, mas questões de política externa, particularmente a guerra contra a Rússia. De forma reveladora, quando Trump se referiu às centenas de bilhões de dólares alocados para a Ucrânia pela administração anterior, os democratas – que permaneceram em silêncio durante seus ataques contra imigrantes e programas sociais – aplaudiram.

Slotkin mencionou explicitamente Ronald Reagan – o presidente que desmontou programas sociais e intensificou as ameaças de guerra nuclear contra a União Soviética – como um modelo a ser imitado. “Como criança da Guerra Fria”, declarou, “estou feliz que Reagan esteve no comando na década de 1980 e não Trump”.

Reagan, disse Slotkin, “estaria se revirando em seu túmulo.” Nisso, ela atribuiu mais ação ao presidente falecido do que ao partido “opositor” vivo, que está se subordinando. Slotkin acrescentou que os democratas eram “todos a favor de cortar desperdícios em programas de assistência”, enfatizando apenas que isso “não deveria ser caótico” – ou seja, que deveria ser feito de uma maneira que evitasse uma explosão social.

Quanto à mídia, ela fez o melhor que pôde para normalizar o discurso de Trump como parte de algum tipo de discurso político legítimo. Jake Tapper, da CNN, referiu-se a seus “momentos tocantes”. O que dizer diante disso?

O que foi revelado na noite de 4 de março foi o submundo político no poder – a fisionomia da oligarquia americana que governa a sociedade. Trump chegou ao topo através de um processo de seleção, em que sua corrupção pessoal, charlatanismo e criminalidade são características apropriadas. A covardia do Partido Democrata reflete o fato de que ele também está controlado pela mesma elite financeira.

Por mais que invoque uma nova “Era Dourada,” o renascimento do “Sonho Americano,” as observações de Trump foram, na verdade, o espasmo final de uma classe dominante que não pode mais governar senão através da violência e da ditadura.

A oposição surgirá e, de fato, já está surgindo. A revolta contra as demissões em massa, a devastação social e os planos fascistas de Trump está crescendo. Ela deve ser desenvolvida como um movimento da classe trabalhadora – lutando contra a ditadura, a oligarquia, o fascismo e a guerra. Essas lutas são inseparáveis, enraizadas na mesma questão básica: o sistema capitalista.