Português

Centrais sindicais montam palanque para governo Lula no Primeiro de Maio no Brasil

O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores – PT) participou na última quarta-feira do ato de Primeiro de Maio convocado pelas maiores centrais sindicais brasileiras, incluindo a CUT controlada pelo PT. Eleito com o apoio unânime e inédito delas em 2022, Lula está levando adiante uma agenda corporativista para integrar os sindicatos ao Estado e suprimir a luta de classes no Brasil.

Lula e o candidato a prefeito de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL), durante a manifestação de Primeiro de Maio em São Paulo [Photo: Ricardo Stuckert/Twitter]

Sob o tema “Por um Brasil mais justo”, o ato de Primeiro de Maio serviu, por um lado, para as centrais sindicais e parte da pseudoesquerda brasileira reunida no Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) preparar o caminho para as eleições municipais deste ano, particularmente em São Paulo, a maior cidade brasileira e onde o ato foi realizado. Por outro, os burocratas sindicais saudaram a alegada “reconstrução do Brasil” que o governo Lula estaria realizando enquanto buscam meios de reverter tanto seu colapso financeiro quanto a queda do número de filiados.

A unidade inédita das centrais brasileiras nos atos de Primeiro de Maio desde a eleição do ex-presidente fascistoide Jair Bolsonaro (2019-2022) foi explicada por Sérgio Nobre, presidente da CUT, que disse que “a unidade das centrais sindicais nos últimos anos ... foi fundamental para a eleição do presidente Lula.” Além disso, esses atos também foram importantes espaços de articulação com políticos burgueses com o objetivo de formar uma aliança com significativos setores da burguesia insatisfeitos com o governo Bolsonaro que culminou no apoio deles à eleição de Lula.

Lula entrou no palco do ato ao lado do líder do Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST) e deputado federal Guilherme Boulos, do PSOL, candidato apoiado pelo PT à prefeitura de São Paulo neste ano. Depois de apresentar uma série dos ministros de seu governo que o acompanhava no palco, Lula disse que a eleição em São Paulo será uma “verdadeira guerra”, com Boulos concorrendo contra o candidato apoiado por Bolsonaro e atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes. Lula apelou para que “cada pessoa que votou [nele] em 89, em 94, em 98, em 2006, em 2010, em 2018… 2022, tem que votar no Boulos para prefeito de São Paulo.”

Um racha do PT que surgiu em 2004 contra a reforma da previdência do primeiro mandato de Lula (2003-2006), o PSOL nos últimos anos tem se aproximado do PT em uma alegada “frente ampla” contra o bolsonarismo. Boulos, o principal articulador dessa frente no PSOL, elogiou Lula no ato de Primeiro de Maio, dizendo que ele é “o melhor presidente da história.”

O nível de oportunismo político que se viu no ato de Primeiro de Maio foi inversamente proporcional ao público presente. Nem Lula deixou de expressar seu incômodo com a falta de “esforço necessário para levar [uma] quantidade de gente” maior do que as 2 mil pessoas presentes, predominantemente burocratas sindicais segurando grandes bandeiras para mascarar o fiasco do ato. As centrais sindicais esperavam 50 mil pessoas.

Mais significativo foi o fato de o ato ter sido realizado pela primeira vez fora do centro de São Paulo. Segundo o presidente da CUT, Sérgio Nobre, a zona leste de São Paulo foi escolhida, pois é uma “uma área de muita concentração operária”.

Ao contrário da alegação de Lula em seu discurso de que o “ato foi mal convocado” – e que esse e outros problemas de seu governo advém supostamente de uma “falta de comunicação” com a população e de “fake news” –, o que existe de fato é uma grande hostilidade dos trabalhadores aos sindicatos e ao seu próprio governo. O amplo histórico de colaboração dos sindicatos com as empresas e o Estado tem feito com que as seguidas lutas de trabalhadores sejam isoladas e desviadas para o beco sem saída de infrutíferas negociações e da política burguesa.

Essa dinâmica foi vista claramente na sexta-feira anterior ao ato de Primeiro de Maio, quando a APEOESP, o sindicato de professores de São Paulo, foi forçada a convocar uma assembleia para aliviar a enorme pressão entre professores contra os ataques crescentes do governador aliado de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas. Na ocasião, a burocracia sindical do PT e do PSOL foi vaiada e hostilizada inúmeras vezes por parte significativa dos mais de 10 mil professores presentes quando fez de tudo para impedir a decretação de uma greve que poderia facilmente sair de seu controle.

Situações como essa, que passaram a se tornar cada vez mais frequentes no Brasil e em todo o mundo, não têm sido causadas pela ação de dirigentes corruptos que poderiam ser substituídos e os sindicatos reformados, como a pseudoesquerda alega. A origem das traições dos sindicatos está na mudança na dinâmica da economia capitalista nos últimos 50 anos. A globalização capitalista minou completamente mesmo o reformismo mais moderado dos sindicatos, que se tornaram incapazes de defender minimamente os salários, as condições de trabalho e os empregos da classe trabalhadora.

Como resultado, a taxa de trabalhadores sindicalizados e as receitas dos sindicatos no Brasil têm colapsado nos últimos anos, um processo que se acelerou com a reforma trabalhista de 2017 do governo do presidente Michel Temer (2016-2018). Entre outras medidas, ela acabou com o imposto sindical obrigatório, que foi inspirado no regime fascista de Benito Mussolini na Itália e instituído em 1943 pela ditadura corporativista do Estado Novo de Getúlio Vargas.

De 2017 a 2022, a receita advinda do imposto sindical diminuiu de 1,5 bilhão de reais para 13 milhões de reais para os sindicatos e de 213 milhões de reais para 1,9 milhão de reais para as centrais sindicais. Já a taxa de trabalhadores sindicalizados no Brasil diminuiu 37% entre 2012 e 2022, passando de 16% para 9%.

Sem dúvida, as centrais sindicais brasileiras veem no governo Lula um aliado para “minimizar os danos”, segundo Ricardo Patah, o presidente da terceira maior central sindical brasileira, a UGT. Para isso, elas contam com o apoio do governo Lula em um projeto de lei que irão apresentar neste mês ao Congresso brasileiro que institui uma taxa a ser paga por trabalhadores e empresários nas negociações coletivas. Os trabalhadores, os filiados ou não aos sindicatos, decidiriam o valor da taxa em assembleia.

Em contrapartida, o governo Lula tem retomado uma série de conselhos e grupos de trabalho tripartites, formados por representantes de sindicatos, de empresários e do governo, e integrado ainda mais os sindicatos ao Estado. Essa e outras medidas corporativistas, como a recriação e fortalecimento do ministério do trabalho que foi entregue ao ex-burocrata sindical Luiz Marinho, foram delineadas em abril de 2022 no documento “Pauta da Classe Trabalhadora” que as centrais sindicais entregaram ao então candidato Lula.

O real caráter de iniciativas tripartites, que partem do pressuposto que pode haver algum interesse comum entre “capital e trabalho”, foi exposto em um projeto de lei elaborado por um grupo de trabalho que o governo Lula apresentou no início de março ao Congresso brasileiro para regulamentar o trabalho de motoristas de aplicativos. Lula disse na ocasião era “um dia muito importante”, pois “Há algum tempo, ninguém neste país acreditava que seria possível estabelecer uma mesa de negociação entre trabalhadores e empresários e que o resultado dessa mesa fosse concluir por uma organização diferente no mundo do trabalho”. A CUT e as outras centrais sindicais também têm apoiado esse projeto de lei.

Porém, inúmeros estudiosos e motoristas têm denunciado o projeto de lei, apelidando-o como “PL da UBER” por assegurar os interesses da maior empresa de transporte de aplicativo. Apesar de garantir alguns direitos aos motoristas, como contribuição à previdência e o pagamento de pelo menos um salário-mínimo, ele mantém os motoristas na condição de “trabalhadores autônomos por plataforma” sem vínculo empregatício.

Significativamente, desde o envio do projeto de lei ao Congresso, motoristas de aplicativos têm realizado uma série de manifestações. A Folha de S. Paulo também informou em 1˚ de maio que “os motoristas de aplicativos que transportam passageiros são contra a possibilidade de sindicalização que consta no projeto de regulamentação da categoria.”

O caráter anti-trabalhador do “projeto de lei da UBER” foi ainda mais exposto no discurso de Marinho em cadeia nacional de rádio e TV na noite de 30 de abril para celebrar o Primeiro de Maio. Cinicamente, ele disse que “É preciso lutar contra a precarização do trabalho, no Brasil e em todas as partes do mundo,” completando: “Por isso, o presidente Lula e o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, firmaram no ano passado, em Nova York, uma parceria inédita pelos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, e em defesa do trabalho decente.”

Enquanto para Lula e seus ministros Biden é o “presidente mais pró-trabalhador da história” e um garantidor da democracia mundial, ele tem sido denunciado nos protestos pró-Palestina como o “Genocida Joe” e, com seu orçamento armamentista recorde a Israel, Ucrânia e Taiwan aprovado recentemente, está colocando o mundo mais próximo do que nunca de uma guerra mundial nuclear.

Qualquer tentativa da pseudoesquerda brasileira fora do PSOL de tentar realizar um ato de Primeiro de Maio “com independência de classe e internacionalista” não passou de uma cobertura ao imperialismo e ao governo Lula. Tal ato foi convocado pela central sindical CSP-Conlutas, controlada pelo morenista Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU).

Como outras organizações pró-imperialista ao redor do mundo, o PSTU e a CSP-Conlutas têm alegado que o povo ucraniano está lutando pela autodeterminação nacional contra o “imperialismo russo”, defendendo o armamento da “resistência ucraniana” pelos EUA e a OTAN. A CSP-Conlutas tem ainda mantido uma estreita relação com sindicatos nos EUA, tendo se encontrado em abril com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Automotiva (UAW), Shawn Fain, e participado da conferência do Labor Notes, ambos apoiadores de Biden e dos democratas pró-guerra.

No Brasil, eles têm semeado a ilusão de que é possível avançar uma luta puramente nacional e sindical contra as reformas pró-corporativa do Ensino Médio de 2016, trabalhista de 2017 e previdenciária de 2019, além das medidas de austeridade do governo Lula que continuam os ataques dos governos Temer e Bolsonaro, como o “novo arcabouço fiscal”, desconsiderando tanto a natureza capitalista global desses ataques quanto a necessidade de avançar uma luta internacional. O Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), a organização irmã no Brasil do Partido dos Trabalhadores Socialistas (PTS) na Argentina, tem ainda defendido que essa luta seja realizada pressionando a CUT e as outras centrais sindicais.

Com políticas como essas, o governo Lula, as centrais sindicais e pseudoesquerda no Brasil estão trabalhando para desarmar a classe trabalhadora e a juventude e pavimentando o caminho para uma guerra mundial nuclear.

Em contraposição, o Comitê Internacional da Quarta Internacional e o World Socialist Web Site realizaram em 4 de maio um ato de Primeiro de Maio que explicou que o genocídio em Gaza e a guerra na Ucrânia são frentes iniciais de uma Terceira Guerra Mundial em desenvolvimento, ameaçando envolver o Brasil e toda a América Latina. O que é necessária é a mais ampla unidade internacional da classe trabalhadora, baseada numa perspectiva socialista, para deter essa ameaça. Fazemos um chamado a todos a estudar as apresentações realizadas no ato de Primeiro de Maio e levar adiante esta luta contra a guerra baseada na mobilização independente da classe trabalhadora internacional na luta pelo socialismo.

Loading