Publicado originalmente em 28 de janeiro de 2022
O conflito que Washington está provocando com a Rússia por conta da Ucrânia ameaça o mundo com uma catástrofe incalculável. Impulsionado pela crise interna sem solução e a gananciosa ambição geopolítica, o imperialismo americano está marchando imprudentemente à beira da Terceira Guerra Mundial.
A crise em torno da Ucrânia foi fabricada pelos Estados Unidos e seus aliados na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) com base em mentiras. A administração Biden denuncia a Rússia pelo movimento de tropas dentro das suas próprias fronteiras. A reivindicação de uma iminente invasão russa da Ucrânia é repetida incessantemente pela Casa Branca e ecoada sem questionamento pela mídia de massa.
É uma propaganda de guerra histérica. A Rússia nunca ameaçou invadir a Ucrânia. Porém, Moscou declarou que não pode tolerar que a Ucrânia se torne parte da OTAN.
A OTAN não é uma aliança geográfica de Estados “democráticos”, mas um grupo imperialista para a guerra com a Rússia e outros países. A incorporação da Ucrânia colocaria armamentos e forças da OTAN na fronteira imediata da Rússia e obrigaria as forças do imperialismo dos EUA e da Europa Ocidental, sob o artigo 5º do Tratado da OTAN, a entrar em guerra em nome do regime de extrema-direita em Kiev, ligado aos neonazistas e fascistas, caso provocasse um conflito com Moscou.
As autoridades americanas revelaram planos de enviar até 50 mil soldados para as fronteiras da Rússia e da Ucrânia. Na quarta-feira, o Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, proferiu uma declaração rejeitando o pedido por escrito de Moscou por garantias de que a Ucrânia não fosse autorizada a aderir à OTAN. A administração Biden não está negociando. Eles não buscam aliviar as tensões, mas sim levar Putin a um conflito armado para que ele possa ser apresentado como o agressor.
Enquanto as tropas dos EUA e da OTAN estão sendo mobilizadas, Washington colocou em movimento o aparato de guerra econômica. Biden e Blinken ameaçaram Moscou com “severas sanções econômicas”, e a Rússia está se preparando para Washington cortar seu acesso ao sistema financeiro global SWIFT para transações com dólar americano, o que excluiria o país de grande parte da economia mundial.
Os EUA invadiram países em todo o mundo, e Putin sabe o que a derrota implicaria para ele. Manuel Noriega e Slobodan Milosevic morreram na prisão, Muammar Gaddafi foi brutalmente assassinado, e Saddam Hussein foi enforcado. Washington quer Putin morto.
A administração Biden criou uma situação que Putin e a Rússia devem interpretar como uma ameaça existencial. Não há concessão que Moscou possa fazer para impedir o avanço das forças da OTAN, exceto a capitulação completa. A Rússia enfrenta a escolha entre a guerra agora ou a guerra no futuro próximo, quando a OTAN estiver à sua porta.
A Casa Branca está marchando imprudentemente para a guerra, mas ninguém está discutindo as implicações. Nenhum repórter pergunta a Biden qual poderia ser o pior cenário possível, e ninguém perguntou se isso poderia implicar o uso de armas nucleares. Washington age como se o conflito que está buscando fosse se limitar às regiões do leste da Ucrânia, isolado no Donbass.
Os Estados Unidos têm travado uma série de guerras desde 1991, e cada uma delas terminou na catástrofe. Milhões estão mortos, e sociedades inteiras no Oriente Médio e na Ásia Central foram reduzidas à poeira e escombros. Elas estavam primitivamente armadas. Washington possui hoje na mira o país que detém o segundo maior estoque mundial de armas nucleares.
Se os Estados Unidos e a OTAN se convenceram de que podem lançar uma ameaça existencial contra a Rússia sem levantar o tremendo risco da guerra nuclear, eles estão se iludindo. Como eles poderiam excluir essa possibilidade? Se eles reconhecem o risco, as suas ações são insanas.
A propaganda de guerra dos EUA e da OTAN retrata Putin como um criminoso louco; toda a estratégia depende da conduta de Putin ser mais sensata do que a sua própria. Há uma fração profundamente reacionária dentro da elite dominante e dos círculos militares russos, muitos dos quais estão preenchidos de todo tipo de concepções fascistas.
A guerra tem uma lógica própria inexorável; ela não obedece aos ordenados enredos elaborados na Casa Branca. A situação militar que Washington está colocando em movimento irá arrastar as grandes potências para um conflito global.
A China enfrenta a demanda de Washington para que abandone sua política de COVID Zero e permita que a pandemia mate milhões de chineses. O impulso dos EUA em direção à guerra na região da Ásia-Pacífico, quase tão avançado quanto o enfrentamento da Rússia, apresenta a Pequim uma ameaça existencial semelhante. A China vê no envio de tropas dos EUA para Taiwan um paralelo direto com os acontecimentos na Ucrânia.
O imperialismo britânico inventa suas próprias mentiras a serviço do impulso de guerra. Washington pressiona a burguesia alemã, com o sangue de 28 milhões de cidadãos soviéticos em sua consciência, a voltar a colocar sua mira no leste.
Em semanas, ‒ senão dias ‒ o início de uma guerra com a Rússia arrastaria o Irã, Israel, China e Taiwan. O Japão e a Austrália seriam rapidamente apanhados na luta em constante expansão. Os imperativos militares tomariam o controle. O mundo seria engolido. As perdas humanas que estão sendo preparadas são incalculáveis.
A classe dominante americana mostrou que é imune à morte em massa. Mais de 900 mil americanos morreram de COVID-19 em menos de dois anos, mas a Casa Branca de Biden nem sequer fala sobre isso. Os noticiários noturnos estão discutindo o tempo e não as mortes diárias. Não há um pingo de consciência que impeça Washington de iniciar uma guerra global catastrófica.
Existe insanidade nessa política, mas é uma insanidade com causas objetivas. O impulso de guerra é alimentado por uma mistura tóxica de ambições geopolíticas insanas e crises internas sem solução.
O conflito parte dos esforços desesperados dos EUA desde a dissolução da União Soviética para restaurar seu domínio geopolítico e compensar suas dificuldades econômicas por meios militares. Enquanto a burocracia stalinista desmontava a União Soviética, as potências imperialistas ponderavam a melhor maneira de aproveitar a devastação social que se seguiu.
Em 1992, um importante acadêmico da política externa, Walter Russell Mead, publicou um artigo significativo no World Policy Journal, com o subtítulo “Uma proposta modesta para a política dos EUA após a Guerra Fria”. Ele defendeu que os EUA comprasse a Sibéria da nação russa empobrecida e lucrasse com “a privatização do vasto depósito de recursos naturais da Sibéria”.
“Essa área contém alguns dos depósitos mais valiosos do mundo de petróleo, gás, diamantes e ouro”, escreveu Mead. “Existem vastos depósitos de madeira; enormes jazidas minerais. Todos esses recursos valem mais como parte dos Estados Unidos do que como parte da Rússia”. Ele escreveu sobre o valor da aquisição de Vladivostok, “um dos melhores portos da Ásia”, e dos royalties a serem assegurados a partir de concessões aos japoneses. Essa é a linguagem da pilhagem imperial.
Mead propôs a compra da Sibéria. Agora Washington busca fins similares por meio de agressão militar para fragmentar o país. Hitler concebia a Rússia como uma fonte de alimentos. Os Estados Unidos possui planos mais grandiosos.
Ainda mais decisivamente, é a crise social explosiva da pandemia e o surgimento da luta de classes aberta que está levando a classe dominante à guerra. A imensa ruptura da vida social produzida pela pandemia global desestabilizou fundamentalmente todos os regimes burgueses.
Um artigo de opinião de Thomas Edsall, publicado na quarta-feira no New York Times, declarou que a intensa polarização social colocou os Estados Unidos em “território inexplorado e muito perigoso”. Ele citou um cientista político dizendo que um “evento despolarizante” bem sucedido teria que ser um “no qual as causas são transparentemente externas”.
Acima de tudo, é isso que alimenta o impulso em direção à guerra. A guerra com a Rússia permitiria que a classe dominante estadunidense usasse o nacionalismo para canalizar a revolta social para fora e daria a ela um pretexto para suprimir a oposição. A crise do capitalismo, levada ao limite pela pandemia, confronta a burguesia com um dilema sem solução, e ela se volta à guerra para encontrar uma saída.
O maior perigo que existe hoje está no vasto abismo entre a escala do perigo e a consciência pública do mesmo. A classe trabalhadora foi mantida sem informações, mentiras foram contadas a ela, foi golpeada pela pandemia e está sendo forçada a voltar ao trabalho.
A classe trabalhadora, que luta para impedir o espalhamento da pandemia e se opõe ao crescimento implacável da desigualdade social e da exploração, deve ser conscientizada politicamente dos planos de guerra da elite.
Qualquer que seja o resultado imediato das provocações em torno da Ucrânia, a situação é imensamente perigosa. A classe trabalhadora deve avançar com base nisso. É necessário não ceder diante dos riscos, mas lutar por uma política correta. O imperialismo está preparando uma catástrofe que só pode ser evitada através do desenvolvimento de um movimento internacional da classe trabalhadora para lutar contra a guerra.
Em 2016, já reconhecendo a intensificação do impulso de guerra do imperialismo americano, o Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI) publicou uma declaração, “Socialismo e a luta contra a guerra”, chamando pela construção de um movimento internacional da classe trabalhadora e da juventude contra o imperialismo. O CIQI apontou os princípios decisivos desse movimento antiguerra:
- A luta contra a guerra deve ser baseada na classe trabalhadora, a grande força revolucionária da sociedade, unindo atrás dela todos os elementos progressivos da população.
- O novo movimento antiguerra deve ser anticapitalista e socialista, pois uma luta séria contra a guerra não pode ser feita a não ser na luta para acabar com a ditadura do capital financeiro e do sistema econômico que é a causa fundamental do militarismo e da guerra.
- • Portanto, o novo movimento antiguerra deve, por necessidade, ser completa e inequivocamente independente e hostil a todos os partidos e organizações políticas da classe capitalista.
- O novo movimento antiguerra deve, acima de tudo, ser internacional, mobilizando o vasto poder da classe trabalhadora em uma luta global unificada contra o imperialismo. A guerra permanente da burguesia deve ser respondida com a perspectiva de uma revolução permanente da classe trabalhadora, cujo objetivo estratégico é a abolição do sistema de estados nacionais e o estabelecimento de uma federação socialista mundial. Isso tornará possível o desenvolvimento racional e planejado dos recursos globais e, com base nisso, a erradicação da pobreza e a elevação da cultura humana a novos patamares.
A urgência de construir esse movimento apenas aumentou. A questão mais decisiva é a luta por essas políticas na classe trabalhadora. Todos aqueles que concordam com essa perspectiva precisam assumir essa luta e aderir ao Partido Socialista pela Igualdade.