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Perspectivas

Quem é responsável pela ascensão do fascistoide Bolsonaro no Brasil?

A um pouco mais de uma semana do segundo turno da eleição presidencial no Brasil, o candidato fascistoide Jair Bolsonaro, que por pouco não alcançou a maioria dos votos válidos no primeiro turno, mantem uma ampla vantagem sobre o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT), Fernando Haddad.

A possível chegada de Bolsonaro à presidência da república representa uma grande ameaça à classe trabalhadora brasileira e latino-americana. O ex-capitão do exército prometeu pôr fim a todas as formas de “ativismo” no Brasil com o objetivo de atender às exigências do capital internacional e brasileiro e realizar novos ataques drásticos às condições de vida e aos direitos fundamentais da classe trabalhadora. Em um país que foi governado por uma ditadura militar durante 21 anos, de 1964 e 1985, essa não é uma ameaça em vã.

A ascensão de Bolsonaro revelou a podridão terminal da ordem política estabelecida no Brasil depois da ditadura militar, expressa sobretudo nas traições, na corrupção generalizada e nos ataques implacáveis à classe trabalhadora brasileira realizados pelo PT ao longo dos 13 anos que ocupou o governo federal, servindo como o instrumento preferido da classe dominante capitalista brasileira. As políticas adotadas pelo PT sob as presidências de Luiz Inácio Lula da Silva e sua sucessora, Dilma Rousseff, renderam ao partido o ódio e o desprezo das massas de trabalhadores que supostamente representavam, abrindo caminho para um fascistoide como Bolsonaro – que foi de um partido da base aliada do PT no Congresso durante todos os governos petistas – se colocar como a oposição populista de direita.

A eleição foi em todos os sentidos um referendo sobre o PT, e sua responsabilidade ao colocar o peso da pior crise econômica do país nas costas da classe trabalhadora brasileira. Os resultados foram uma rejeição esmagadora do partido, com a vitória de Bolsonaro por uma ampla margem na região industrial do ABC, onde o PT foi fundado em 1980, bem como em praticamente todos os outros centros da classe trabalhadora no país. Os trabalhadores também passaram em massa longe das urnas, com 29% do eleitorado – um percentual maior do que o obtido por Haddad – se abstendo ou optando por não votar em nenhum candidato.

Diante desse cenário, todas as organizações da pseudoesquerda que orbitam o PT uniram-se sob o pretexto de combater a ameaça do fascismo ao tentar mais uma vez encurralar os trabalhadores atrás desse partido profundamente desacreditado chamando voto para o candidato Haddad no segundo turno.

Todas essas organizações estão repetindo o mesmo refrão: enquanto chamam o voto em Haddad, não oferecem a ele e a seu partido nenhum apoio político.

O PSTU, a maior organização morenista do Brasil, declarou que, “no segundo turno, sem dar nenhum apoio ao PT, devemos votar 13 contra Bolsonaro.”

O MRT, a seção brasileira do principal grupo morenista argentino, o PTS, afirmou que “sem dar nenhum apoio à política do PT ..., acompanhamos o ódio e a vontade de luta contra Bolsonaro, votando criticamente em Haddad.”

Tudo isso é um absurdo completo. Votar em Haddad e em seu partido e fazer agitação política para que os outros façam o mesmo significa apoiar politicamente o PT.

Além disso, se a eleição de Haddad é o único meio de combater o perigo do fascismo no Brasil, então a defesa de seu governo – se ele for eleito – contra a direita e os militares que tentarem derrubá-lo tornar-se-á igualmente necessária.

Esse, é claro, foi o caminho percorrido pelos antecessores dessas mesmas organizações pseudossocialistas e ex-trotskistas nos anos 60 e 70 em relação aos governos de Goulart no Brasil, Perón na Argentina e Allende – que convidou Pinochet para seu gabinete – no Chile. Todos eles suprimiram as lutas dos trabalhadores e abriram o caminho para as sangrentas ditaduras militares que mataram, torturaram e aprisionaram centenas de milhares de pessoas nesses países. Esses chamados grupos de esquerda são incapazes de aprender qualquer lição dessa trágica história.

Entre os mais absurdos álibis para apoiar Haddad e o PT está o de Jorge Altamira, o líder do Partido Obrero (PO) na Argentina. Ao mesmo tempo que Altamira reconhece que o PT tem servido como o “instrumento preferido da burguesia” desde 2003 e descreve o partido como uma “camarilha em decomposição”, ainda assim chama o em seu candidato, alegando que ele servirá como uma “ponte para as massas que estão procurando, apesar do PT, um caminho de combate contra o fascismo”.

De quais massas Altamira está falando? Os trabalhadores abandonaram o PT, o que torna impossível o partido construir qualquer ponte para se combater o fascismo, além de espalhar mais desorientação política às massas. O apoio ao PT não é um caminho de luta, mas de subordinação a um partido capitalista.

Para justificar a sua posição, ele diz que o PO está pedindo voto para Haddad baseado não na política do PT, mas nas políticas “definidas pelo ‘movimento feminista’”, como expressas nas manifestações #elenão organizadas antes da eleição.

Essas manifestações atraíram centenas de milhares de pessoas apesar, não por causa, de sua liderança feminista pequeno-burguesa, que procurou unir todas as mulheres – inclusive candidatas de partidos burgueses de direita – contra Bolsonaro. Essa é a verdadeira orientação do partido de Altamira e de todos os partidos da pseudoesquerda como o PO. Eles se opõem ao desenvolvimento de um movimento de esquerda da classe trabalhadora contra o capitalismo e procuram reforçar os movimentos de direita da classe média baseados em uma variação qualquer da política de identidade.

Essa orientação, no caso do PO, anda de mãos dadas com sua aliança com partidos nacionalistas de direita na Rússia.

O claro oportunismo da posição de Altamira aparentemente provocou alguma discórdia dentro do PO. O historiador e antigo apoiador do PO Daniel Gaido postou no Facebook um relato de uma conversa com o líder do partido na qual afirmou que “o PT é responsável por essa ascensão da direita [e] que paralisa as massas”. Gaido ainda disse que, considerando seguir o movimento feminista contra Bolsonaro – as manifestações #elenão – seria possível ter chamado o voto em Hillary Clinton contra Donald Trump – e, deve-se acrescentar, se está preparando para se alinhar a peronista Cristina Fernández de Kirchner na Argentina.

No entanto, procurando encontrar argumentos para apoiar a posição do PO, Gaido declarou que isso “deve ser verificado com os escritos de Trotsky”. O bom professor pode enfiar o nariz em quantos livros quiser, mas em nenhum lugar encontrará uma justificativa de Trotsky para dizer às massas que votem em um candidato capitalista de direita como uma maneira de se derrotar o fascismo.

Com todas essas organizações, a corrida precipitada em apoiar Haddad é um caso, como disse Marx, de justificar a porcaria de hoje com a porcaria de ontem.

Em 1980, Altamira, então exilado no Brasil, juntou-se aos seguidores da OCI francesa de Pierre Lambert, da tendência argentina liderada por Nahuel Moreno e do Secretariado Unificado Pablista de Ernest Mandel e desempenhou um importante papel na fundação do PT. Todas essas tendências entraram no PT e o promoveram como uma nova e única via parlamentar para o socialismo no Brasil. Elas exaltaram Lula, um sindicalista de direita que rapidamente cimentou os laços mais próximos com as grandes empresas e o imperialismo. Todas essas organizações têm uma responsabilidade decisiva pela ausência de uma alternativa de esquerda em relação à política capitalista do PT e a consequente ascensão do populismo de direita e de uma figura política repulsiva como Bolsonaro.

O revisionismo pablista, em suas várias formas, rompeu com o movimento trotskista organizado no Comitê Internacional da Quarta Internacional por rejeitar a luta pela construção de partidos revolucionários na classe trabalhadora e a luta para desenvolver a consciência socialista da classe trabalhadora. Antes do PT, eles encontraram no castrismo e nas teorias retrógradas da guerra de guerrilha o substituto para o papel revolucionário da classe trabalhadora. A promoção dessa orientação política levou a derrotas catastróficas em toda a América Latina.

Mais recentemente, essas mesmas tendências saudaram Hugo Chávez e o governo venezuelano que se sustenta nos militares e no capital financeiro, caracterizados como o “socialismo bolivariano”, como uma nova alternativa revolucionária, uma “Maré Rosa” ou “virada à esquerda” que varreria a América Latina.

A crise capitalista mundial que se iniciou em 2008 e devastou as economias emergentes não deixou uma pedra sobre a outra desse movimento. A classe trabalhadora enfrentou ataques devastadores na Venezuela, no Brasil, na Argentina e em países onde supostamente os governos de “esquerda” estavam no poder, levando ao fortalecimento das forças políticas de direita.

Essa tendência não será revertida, mas apenas fortalecida se o PT retornar ao poder no Brasil. Haddad já está realizando a campanha mais à direita da história do partido, apelando para o apoio dos militares, das grandes empresas e da Igreja Católica.

A classe trabalhadora foi totalmente marginalizada do processo político que acontece hoje no Brasil; nenhum dos candidatos expressa minimamente os interesses dos trabalhadores do país.

Grandes lutas estão por vir. A burguesia brasileira não conseguirá impor o fascismo ou a ditadura militar através das urnas.

O mais importante ao responder ao perigo do fascismo é a luta para desenvolver a consciência política dos trabalhadores, assimilar as amargas lições da experiência com o PT e, a partir disso, construir um novo partido independente, revolucionário e internacionalista da classe trabalhadora, ou seja, a seção brasileira do Comitê Internacional da Quarta Internacional.

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