Publicado originalmente em 21 de maio de 2021
Conforme os óbitos diminuem no desfecho imediato da segunda onda da pandemia de COVID-19 no Brasil durante abril, o número de novos casos já está aumentando novamente. A média móvel de novos casos diários aumentou de 56.533 em 26 de abril para 64.665 em 19 de maio, em direção aos níveis de março, que resultaram em uma diminuição historicamente sem precedentes da população em muitos estados no mês passado, incluindo estados populosos nas regiões Sul e Sudeste, como resultado direto de mortes por COVID-19.
Desde abril, o número de óbitos tem diminuído, caindo para 1.901 em 17 de maio. Entretanto, desde março, tanto o número de mortes quanto o número de novos casos permaneceram acima da escala da primeira onda do período de maio a agosto do ano passado. Um relatório de 13 de maio da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) apontou que "A observada manutenção de um alto patamar, apesar da ligeira redução nos indicadores de criticidade da pandemia, exige que sejam mantidos todos os cuidados, pois uma terceira onda agora, com taxas tão elevadas, pode representar uma crise sanitária ainda mais grave".
O Brasil registrou um total de mais de 15.800.000 casos e 440 mil mortes até o momento, mantendo-se o segundo país com mais óbitos por mais de um ano até o atual surto mortal na Índia, que superou os óbitos tanto no Brasil quanto nos EUA na quinta-feira.
A Fiocruz advertiu que um novo surto, dado o cenário atual de altas taxas de incidência, "será catastrófico", ele dará uma "oportunidade para o surgimento de novas variantes do vírus devido à intensidade da transmissão, como temos visto em outras regiões e países".
Esses avisos não interromperam a campanha pela reabertura das economias em todos os estados no Brasil, encoberta por afirmações mentirosas de que a estabilização dos casos significa que a pandemia está "sob controle".
Desde 18 de abril, o governador do estado de São Paulo do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), João Doria, anunciou medidas da "fase de transição", reabrindo a economia com base em uma pequena queda nas taxas de ocupação de Unidades de Terapia Intensiva (UTI), tendo caído a partir de mais de 90% em abril para 79% esta semana.
O número atual de UTIs ocupadas em São Paulo está acima de 10 mil, muito pior do que durante a primeira onda, quando atingiu um pico de 6.500. Existem atualmente sete estados com mais de 90% dos leitos de UTI ocupados, e outros sete que apresentam taxas acima de 80%.
Durante uma coletiva de imprensa no dia 19, o Secretário de Saúde de Doria, Jean Gorinchteyn, declarou que o aumento nas taxas de ocupação de enfermarias no estado confirmava a eficácia da vacinação, "aumentando o número de pacientes com sintomas leves", enquanto o aumento de novos casos era resultado de "um aumento nos testes".
No mesmo dia, Doria declarou uma nova etapa na reabertura da economia a partir de 1º de junho, aumentando o número de horas de atendimento presencial no comércio e elevando o limite de pessoas permitidas dentro dos estabelecimentos para 60%. Desde abril, durante a segunda onda, os governos estaduais de todo o país começaram a reabrir suas economias, inclusive nos estados governados pelo Partido dos Trabalhadores (PT).
No Ceará, onde o governador do PT, Camilo Santana, reabriu o comércio e as escolas para crianças pequenas em abril, o número de novos casos aumentou durante nas últimas três semanas. As UTIs do estado estão atualmente 93% ocupadas. Isso não impediu que o secretário de saúde do estado declarasse nesta semana que "as taxas de transmissão já estão se estabilizando".
Enquanto isso, os graves riscos colocados pela estabilização no número de novos casos estão sendo encobertos pela mídia, que tem promovido a chegada de pequenos lotes de vacinas como um grande avanço na luta contra a pandemia, ao mesmo tempo em que informa sobre as alterações semanais nos horários de abertura de lojas, restaurantes e academias e a reabertura das escolas. O último avanço, representando vacinação completa para 4% da população, foi anunciado com alívio pela mídia no dia 17, em meio a relatos de uma interrupção total da distribuição devido à escassez de vacinas em todo o país.
Os esforços dos governos e da mídia visam evitar uma onda de oposição no Brasil, dado que o ritmo lento da imunização em meio a altos níveis de novos casos de coronavírus está criando as condições para uma explosão de revolta popular contra as políticas da classe dominante na pandemia. Ela prevê claramente o perigo de que as manifestações massivas que abalaram a Colômbia por mais de uma semana se espalhem para o Brasil e toda a região.
As tentativas enganosas de promover os esforços de vacinação como a única resposta efetiva à pandemia foram expostas por um estudo recente, publicado ainda sem revisão por pares, em 12 de maio. O estudo estima que 16,9% de todas as infecções de Manaus pela variante brasileira P.1 em 2021 foram reinfecções, ilustrando os efeitos de deixar o vírus se espalhar pela população sem medidas de distanciamento social ou rastreamento de contatos.
Em recente entrevista, Dimas Covas, o chefe interino do Centro de Contingência do Coronavirus do governo do estado de São Paulo e presidente do Instituto Butantan, uma das duas unidades produtoras de vacinas no país, declarou que uma campanha eficaz de vacinação só se tornaria realidade durante setembro ou outubro. Em março, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, adiou de abril para setembro o prazo para vacinação total dos grupos prioritários, incluindo profissionais de saúde e idosos.
Os esforços da Fiocruz, um dos centros de produção de vacinas, enfrentaram sucessivos imprevistos, principalmente devido a atrasos na importação de materiais necessários para a produção. Tais atrasos ocorrem conforme os esforços de imunização global são interrompidos pela competição de todas as principais potências capitalistas, que se recusam a quebrar patentes de vacinas e bloqueiam a exportação de matérias-primas para produção de vacinas.
Além disso, as tentativas da grande mídia de se promover como defensores do uso de máscaras são desmentidas pelas notícias sobre as novas diretrizes do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) americano, que permitem o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras e distanciamento social nos EUA. Uma notícia do Estado de São Paulo sobre as novas diretrizes ecoou a campanha propagandística da administração Biden, afirmando: "A medida tenta oferecer garantias de que alguma aparência de vida normal pode retornar", e acrescentando que "A nova orientação chega no momento em que metade dos adultos norte-americanos já recebeu ao menos uma dose de vacina contra covid-19, de acordo com o CDC".
A idéia não-científica de que a obrigatoriedade do uso de máscaras pode ser relaxada depois que metade da população receber uma dose de vacina é um programa de infecção em massa, sendo apoiado pelo Estado e pelos interesses empresariais que o jornal representa.
No mês passado, a Folha de São Paulo publicou um artigo fazendo a falsa afirmação de que a reabertura das escolas não teve efeito sobre novos casos no estado com maior número de estudantes do país. Um dos autores do artigo, João Paulo Cossi Fernandes, trabalhou na Fundação Lemann durante 2016-2017.
A fundação está entre as principais ONGs e think tanks educacionais, tendo trabalhado junto com o governo para impulsionar a "reforma" da educação nacional em 2017, o que resultou na piora das condições de trabalho dos professores e está agendada para pôr fim ao ensino noturno até 2022, o que significa a exclusão de milhões de alunos que precisam trabalhar durante o dia.
Desde o ano passado, a fundação se dedicou a promover o retorno às aulas presenciais em conjunto com os governos estaduais de todo o país, utilizando a falsa afirmação de que as crianças não são vetores significativos de transmissão para o coronavírus.
O mortal espalhamento da pandemia na Índia e países vizinhos está mostrando novamente que o coronavírus não pode ser colocado sob controle em um estado ou país sem uma resposta coordenada global. Nesta semana, os estados mais ao sul do Brasil entraram em alerta para novos casos após o aparecimento da variante indiana na Argentina. Além disso, o relatório da Fiocruz de 13 de maio declarou que quatro estados brasileiros já estavam mostrando uma tendência de aumento de novos casos, representando o risco de uma terceira onda que poderia se espalhar sem controle por toda a região.
A resposta criminosa à pandemia pelo governo, baseada nos interesses dos bancos e corporações, deve ser enfrentada com uma luta organizada pela classe trabalhadora no Brasil e internacionalmente.
O Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI) está propondo a formação da Aliança Operária Internacional dos Comitês de Base (AOI-CB) como uma resposta global coordenada da classe trabalhadora à pandemia global. Ela deve ser parte da luta para derrubar o sistema capitalista, que é incapaz de produzir uma resposta racional e humana à pandemia, e para construir uma sociedade socialista, ou seja, uma sociedade baseada na necessidade humana.
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