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Trabalhadores argentinos na encruzilhada

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Este documento foi publicado originalmente em sete partes, entre dezembro de 1988 e janeiro de 1989, no Bulletin, jornal da Workers League, a predecessora do Partido Socialista pela Igualdade (EUA) e então seção americana do Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI).

No presente formato, ele foi publicado em 1989 na revista Fourth International Vol. 16 Nº 1-2, publicação internacional do CIQI.

Os morenistas e a junta

Após uma derrota como a de 1976, um partido revolucionário teria analisado duramente tal experiência estratégica e o papel cumprido nela pelo partido. Só assim seria capaz de rearmar-se para desempenhar um papel revolucionário no futuro.

Mas quase 13 anos depois do golpe de 1976, a tendência morenista ainda não fez uma análise séria dessa experiência. Quanto ao seu próprio papel, os líderes morenistas tendem a descartar qualquer questão com a patética desculpa de que o grupo era "pequeno demais" para alterar o curso dos acontecimentos.

Quando questionada sobre documentos escritos avaliando esse período, a direção morenista aponta para um panfleto de Nahuel Moreno intitulado 1982: A Revolução Começa. Sua tese central é que a transferência de poder do general Galtieri para o general Bignone naquele ano constituiu "a vitória da revolução democrática"! – uma proposta inédita à qual voltaremos.

O panfleto de Moreno revela o caráter pequeno-burguês de sua tendência. Ele não atribui a culpa da derrota de 1976 à traição das direções peronista, stalinista e centristas do movimento operário, mas aos próprios trabalhadores.

Nahuel Moreno

Ele escreveu: "Durante todos estes anos, a classe trabalhadora da Argentina não foi capaz de superar esta contradição entre sua consciência política ultracapitalista, reacionária, que olha para trás, que quer retornar a um governo burguês, paternalista e bonapartista que lhe faça concessões, sem se importar se é reacionário ou não, e sua tremenda combatividade.

"Uma expressão clara do atraso político dos trabalhadores (1955-1973) é que eles querem voltar para trás, para o governo burguês bonapartista de Perón, e não andar para frente a um governo operário. Essa consciência atrasada é a chave para a tremenda força de Perón e sua burocracia sindical, que puderam manipular os trabalhadores para que agissem diretamente contra seus próprios interesses históricos, acatando a ordem de votar em Frondizi – um governo diretamente pró-imperialista".

Cada palavra de Moreno o expõe como um cínico mentiroso e um oponente consciente da revolução socialista. Enquanto o movimento trotskista luta para solucionar a crise da direção revolucionária expondo e derrotando as políticas, partidos e burocracias traidoras do movimento operário, o ponto de partida de Moreno é a suposta "consciência política ultracapitalista e reacionária" e o "atraso" do trabalhador argentino.

Moreno atribuiu sua própria covardia e oportunismo aos trabalhadores. Ele os acusou de querer andar "para trás" com Perón e não para frente com um governo operário, mas deixou de mencionar que seu próprio jornal trazia o emblema "sob a disciplina do general Perón". Ele teve a audácia de afirmar que os trabalhadores eram tão "atrasados" que seguiram as ordens de Perón para votar no pró-imperialista Frondizi! Mas é bem sabido que sua tendência chamava tal voto, para preservar a "unidade e disciplina do movimento", enquanto as massas operárias desafiavam as instruções do general, depositando cédulas em branco em protesto.

Após se referir ao confronto entre a classe trabalhadora e sua direção peronista no período anterior ao golpe, Moreno declarou: "No entanto, foram levantados dois obstáculos importantes que impediram que essa desilusão fosse convertida em uma ruptura massiva. O primeiro foram os próprios Montoneros (o movimento guerrilheiro peronista de esquerda), com sua política elitista e criminosa. Eles fizeram sua própria guerra civil de bolso contra o governo, com métodos que eram estranhos à classe trabalhadora... os Montoneros tiraram das fábricas, universidades e escolas secundárias a vanguarda operária e estudantil que eles majoritariamente organizavam, separaram-na das massas abortando a possibilidade de que surgisse uma nova direção alternativa à burocracia do partido peronista, e levando-a ao extermínio". O segundo obstáculo, segundo Moreno, foi o próprio golpe.

Mas Moreno e os pablistas foram internacionalmente os principais proponentes da "guerra civil de bolso", ou seja, da guerrilha como a estratégia revolucionária para a América Latina nos anos 1960. Nos anos 1970, os morenistas acabaram se opondo à guerrilha somente para poderem fundir-se ao partido social-democrata direitista de Juan Coral e curvar-se diante do peronismo e do Estado burguês. Para ganhar a aprovação dos burocratas sindicais peronistas, eles denunciaram como criminosos aqueles trabalhadores e jovens que levaram a sério sua propaganda anterior sobre o guerrilheirismo.

Baseando-se em tal método, os morenistas foram incapazes de tirar qualquer lição do golpe de 1976. Ao invés disso, sua trajetória política foi à direita.

Cada vaga declaração da junta alegando defender as instituições da democracia burguesa foi tomada pelos morenistas como prova de suas intenções democráticas. Em março de 1978, eles escreveram em seu jornal, Opción: "O general Videla falará. Certamente confirmaremos que as autoridades estão procurando uma abertura política em seu caminho. Estamos confiantes de que o povo trabalhador fechará a brecha que existe entre a abertura político-militar cautelosa e uma verdadeira saída democrática".

Até mesmo os pablistas europeus acharam difícil de tolerar os morenistas acusando ativistas dos direitos humanos que exigiam um boicote à Copa do Mundo de futebol em Buenos Aires de intensificar a repressão na Argentina. Isso num momento em que a máquina de matar da junta já operava a todo vapor.

No final de 1980, o PST ganhou a ira dos parentes dos desaparecidos ao publicar uma revista chamada Anistia que defendia uma "anistia irrestrita". Essa palavra de ordem foi denunciada como uma absolvição completa dos crimes dos assassinos e torturadores militares responsáveis pela morte de dezenas de milhares de trabalhadores e jovens argentinos.

Esse acobertamento da junta veio acompanhado de uma perspectiva de ressuscitar uma aliança de frente popular com os partidos capitalistas. "Apelamos aos partidos políticos [burgueses], com os quais temos tantas divergências sobre como resolver a crise, para lutarmos juntos pela saída democrática", escreveram no Opción em agosto de 1978.

Quando a crise econômica do início dos anos 1980 provocou insatisfação na burguesia argentina em relação às políticas econômicas da junta (mas quase nenhuma crítica aos assassinatos em massa e tortura), o PST pediu aos políticos capitalistas que o incluíssem em sua aliança multipartidária, que foi ressuscitada para exercer pressão sobre o regime militar.

Essa adaptação à política burguesa e ao Estado capitalista na Argentina foi (e continua sendo) acompanhada de operações internacionais oportunistas e sem princípios.

Os morenistas romperam com o Secretariado Unificado pablista por uma disputa sobre a Brigada Simon Bolívar e suas atividades na Nicarágua. Formada por apoiadores de Moreno na Colômbia e na América Central, a brigada se vestiu com o verde-oliva dos guerrilheiros, mas chegou apenas dias antes da queda de Somoza e jamais foi autorizada a entrar em combate. Nomeada em homenagem ao revolucionário burguês latino-americano do século XIX, foi concebida inteiramente do ponto de vista da adaptação política aos nacionalistas pequeno-burgueses da Frente Sandinista de Libertação Nacional. Entretanto, em pouco tempo, foi expulsa pelos sandinistas sob a mira de suas armas.

Apesar dos pablistas terem saudado a brigada de início, quando o barco furou, eles denunciaram os morenistas como sectários. Já a direção – infiltrada por policiais – do Socialist Workers Party, que até segundos antes da vitória da revolução nicaraguense denegrira os sandinistas, de repente solidarizou-se publicamente com a expulsão dos morenistas, ao mesmo tempo em que começou a enviar literalmente centenas de "jornalistas socialistas" e turistas radicais ao país.

Os morenistas romperam com os pablistas e partiram para uma unificação sem princípios com a OCI, o grupo de Pierre Lambert na França, apropriando-se desavergonhadamente do nome do "Comitê Internacional da Quarta Internacional", com o qual Moreno rompera há mais de 17 anos (e Lambert há uma década). Essa colcha de retalhos internacional era totalmente orientada a manobrar com o Secretariado Unificado, do qual um representante foi convidado como observador para a fundação da aliança. O caráter sem princípios dessa fusão ficou evidente nove meses depois, quando Lambert e Moreno se separaram em meio a violentas denúncias mútuas.

Moreno, praticamente sem uma pausa para respirar, anunciou a formação de uma nova frente internacional composta por seu partido na Argentina e algumas outras organizações latino-americanas, com base na mesma política podre. Essa frente, conhecida como Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT), continua até os dias de hoje.

Tudo isso condicionou a tendência morenista a servir mais uma vez como adereço de esquerda para a ordem burguesa num momento em que a classe dominante argentina entrava numa crise mortal provocada pela recessão capitalista mundial do início dos anos 1980.

Em resposta às crescentes greves de massas e aos violentos confrontos entre trabalhadores e as forças de segurança, a junta empregou uma última carta desesperada para desviar a luta de classes e consolidar uma "unidade nacional". Foi a invasão de abril de 1982 das Ilhas Malvinas, colonizadas pela Grã-Bretanha.

Os morenistas opuseram-se à luta pela mobilização política independente da classe trabalhadora durante a guerra das Malvinas. Ao invés de basear a luta contra os imperialistas nos objetivos revolucionários socialistas próprios do proletariado, o PST atuou para subordinar os trabalhadores à burguesia e à própria junta.

Na guerra das Malvinas, os marxistas tinham a obrigação de se posicionar pela derrota da Grã-Bretanha, uma nação imperialista opressora, e em defesa da Argentina, uma nação semicolonial, oprimida, com o entendimento de que tal resultado criaria as melhores condições para a derrubada tanto do imperialismo quanto de seus agentes nacionais na forma da ditadura militar.

Para um partido revolucionário na Argentina, a obrigação central seria expor os objetivos contrarrevolucionários da junta e seu papel como a principal agência do imperialismo dentro do país. Absolutamente nenhuma confiança política ou militar poderia ser dada a um tal regime ou a qualquer setor da burguesia nacional. O partido teria que lutar com a perspectiva da revolução permanente, insistindo que a luta contra o imperialismo só poderia ser vitoriosa sob a direção da classe trabalhadora combatendo pela revolução proletária socialista.

O PST, hostil a essa abordagem marxista, reagiu à guerra das Malvinas do ponto de vista do nacionalismo pequeno-burguês. Ele se adaptou à venenosa onda de chauvinismo lançada pela junta sobre a classe média e cerrou fileiras com o regime dos torturadores.

Os morenistas declararam orgulhosamente ocupar o "mesmo campo militar que a ditadura" e descreveram a decisão de invadir as Malvinas como uma "ação progressista". Mas qual era a natureza desse campo e dessa ação? A junta promoveu essa aventura como uma última tentativa de evitar a revolução. Os recrutas inexperientes foram largados congelando nas Malvinas, enquanto, em muitos casos, seus oficiais torturadores lhes davam ordens por rádio a partir de posições seguras atrás das linhas.

Em uma declaração publicada na revista morenista Correo Internacional, então publicada na Colômbia, o PST explicitou sua posição: "Sem cessar por um momento de denunciar a política de classe repressiva e antioperária da ditadura argentina, bem como sua inconsistência diante do próprio imperialismo britânico, centraremos nossa atividade em denunciar a rapacidade colonialista da Inglaterra". E acrescentou: "Ainda que compreendamos e compartilhemos a desconfiança e indignação do proletariado argentino, afirmamos novamente que isto não deve impedi-lo de levantar mais uma vez a bandeira anticolonialista e anti-imperialista".

Em outras palavras, a tendência morenista tentava semear ilusões na junta em condições em que reconhecia que os trabalhadores sentiam profunda "desconfiança e indignação" pelos objetivos contrarrevolucionários do regime na guerra. Ao invés de insistir que uma verdadeira luta contra o imperialismo só poderia ser travada sob a direção do proletariado, combatendo com o programa da revolução socialista, o PST conclamou os trabalhadores a se subordinarem à fraudulenta "bandeira anticolonialista e anti-imperialista" da burguesia.

Ele jamais levantou reivindicações independentes de classe no curso da guerra. O PST não se colocou pelo armamento da classe trabalhadora, a formação de uma milícia operária, etc. Ao invés disso, convocou os trabalhadores a constituir uma espécie de Exército de Salvação. Em sua declaração do Primeiro de Maio de 1982, os morenistas conclamaram a classe operária a "organizar a coleta de roupas, alimentos, livros, cartas para enviar ao front" e a doar sangue, etc., para apoiar a operação militar da junta.

No próprio panfleto dos morenistas que reporta seu histórico nas Malvinas, a palavra de ordem "abaixo a junta" jamais é levantada.

A derrota dos militares argentinos nas Malvinas significou o colapso da junta. Esse regime, apesar dos mais de seis anos de brutal repressão, mostrou-se incapaz de conter o ressurgimento do movimento operário e impor o tipo de programa econômico de fome exigido pelo FMI e pelos bancos de Wall Street.

Na Argentina, como no resto da América Latina durante esse mesmo período, a burguesia nacional, com a plena aprovação e assistência do imperialismo americano, tentou realizar uma transferência de poder a regimes civis chefiados pelos partidos burgueses tradicionais. O propósito dessa transição era prevenir novas explosões revolucionárias e garantir a colaboração dos nacionalistas burgueses, assim como das direções stalinistas e centristas do movimento operário, baseada no cretinismo parlamentar.

Na Argentina, esse processo contou com o apoio entusiasmado dos morenistas, que novamente deram cobertura às verdadeiras forças de classe operando nesta transição política e insistiram que a retirada dos militares do palácio presidencial constituía a "vitória da revolução democrática".

Nisso se resume a tese do panfleto 1982: A Revolução Começa de Moreno, citado por seus seguidores como o principal trabalho do período final de sua vida, que chegou ao fim no início de 1987.

Nele Moreno declarou que a imposição do General Bignone enquanto supervisor da transferência de poder a um novo regime civil constituiu "o evento mais importante do século".

Ele escreveu: "Concretamente, a partir de junho do ano passado [1982], a Argentina é um país completamente diferente, que não tem nada a ver com o anterior. Estamos vivendo uma etapa ou regime (ou como queira chamá-lo) absolutamente distinto do horror e terror que sofremos durante os seis anos e três meses que vão desde o golpe de março de 1976 até junho de 1982. Aquele que não vê e não reconhece que a de antes e a de depois dessa data são duas situações total e absolutamente diferentes é um sectário incorrigível".

É impossível deixar de notar que os morenistas minimizaram o "horror e o terror" durante os anos da ditadura, mas assim que ela terminou, enfatizaram que o novo regime não tinha "nada a ver com o anterior". Que falsificação! Os partidos burgueses que assumiram o poder haviam apoiado e colaborado com todos os crimes da junta. E, como os acontecimentos recentes deixaram claro, os militares jamais renunciaram verdadeiramente a seu poder.

Apesar de Moreno ter afirmado que tudo ficou "total e absolutamente diferente" depois de 1982, é evidente que duas coisas continuaram muito parecidas. Primeiro, a classe capitalista permaneceu no poder, enquanto mudava sua forma de ditadura de militar a parlamentar, e segundo, a tendência morenista continuou a servir como o adereço esquerdo do domínio burguês.

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