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Um milhão de pessoas saem às ruas contra cortes na educação e austeridade no Brasil

Publicado originalmente em 18 de Maio de 2018

Na quarta-feira, 15 de maio, a crescente raiva social contra as medidas de austeridade do governo fascista do presidente Jair Bolsonaro explodiu nas ruas do Brasil. Mais de um milhão de estudantes e professores deixaram a sala de aula e participaram das manifestações inicialmente convocadas pelos sindicatos dos professores para liberar parte da enorme pressão social contra a reacionária “reforma” da previdência proposta pelo governo.

Em ambas as maiores cidades do Brasil, São Paulo e Rio de Janeiro, mais de cem mil manifestantes compareceram aos protestos, enquanto dezenas de milhares participaram de manifestações em outras grandes capitais, como Recife e Salvador, no nordeste, Belo Horizonte, no sudeste, e Porto Alegre, no extremo sul, bem como na capital, Brasília. No geral, todas as capitais de estado e outras 170 cidades foram palco de manifestações, mesmo no interior das regiões mais remotas e pouco povoadas da Amazônia e do oeste do Brasil.

Enquanto o Partido dos Trabalhadores (PT) e os sindicatos têm tentado, até agora, estrangular as crescentes lutas dos trabalhadores, especialmente acabando com a greve de 33 dias dos professores da prefeitura de São Paulo contra a vontade da base em meados de março, os trabalhadores e a juventude brasileiros encontraram nas manifestações de 15 de maio uma maneira de expressar a ampla oposição não apenas a Bolsonaro, mas a todo o establishment político, com manifestantes comparando os governadores do PT ao presidente fascista e seus aliados por implementarem medidas brutais de austeridade e pedindo desculpas pelas homicidas forças policiais militares de seus estados.

A manifestação foi convocada em 5 de abril pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), filiada à CUT e controlada pelo PT, “se a reforma da previdência passar na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados”, segundo o presidente da CNTE, Heleno Araújo Filho. A admissibilidade da reforma da previdência, por sua vez, foi aprovada na CCJ no final de abril.

A trégua de quase um mês e meio da CNTE teve o objetivo dar tempo para as negociações no Congresso acontecerem e para a mobilização ser sabotada, como os mesmos sindicatos haviam feito com o “dia nacional de luta” em 24 de abril. No entanto, um corte orçamentário de 30% para todas as instituições federais – de escolas de ensino médio a faculdades e universidades – anunciado em 30 de abril gerou uma onda crescente de protestos espontâneos, pressionando tanto a CNTE quanto a União Nacional dos Estudantes (UNE) a impulsionarem as greves e manifestações.

O gatilho imediato para as manifestações foi o anúncio feito pelo ministro da Educação, o professor de economia de extrema direita, Abraham Weintraub, de que seu ministério cortaria o orçamento das universidades que permitiam a “balbúrdia” nos campi, dizendo mais tarde ao Estado de S. Paulo que por “balbúrdia” ele se referia a eventos políticos, como “permitir trabalhadores sem terra no campus”. Weintraub disse que entre as primeiras universidades que teriam o orçamento cortado estaria a Universidade Federal Fluminense, no Rio de Janeiro, que foi obrigada a retirar faixas antifascistas dos estudantes durante as eleições do ano passado diante da ameaça de seu reitor ser processado criminalmente. O tribunal eleitoral considerou que as faixas eram “propagandas eleitorais” contra Bolsonaro.

O anúncio dos cortes foi imediatamente percebido como uma tentativa do fascista ministro da educação de impor censura política. Weintraub ficou famoso com a divulgação do vídeo de uma palestra sua de 2018 em que parafraseava os nazistas, dizendo que “os comunistas estão no topo do país. Eles são o topo das organizações financeiras. Eles são os donos dos jornais. Eles são os donos dos monopólios.” Os cortes de financiamento vieram dias após Bolsonaro anunciar pelo Twitter que iria “descentralizar investimentos em faculdades de sociologia e filosofia” em todo o país, e um mês depois do ministro da educação afirmar: “imagina uma família de agricultores que o filho entrou na faculdade e, quatro anos depois, volta com o título de antropólogo.”

Diante do enorme repúdio aos cortes, o governo ampliou o corte de 30% para todas as instituições federais de educação – 60 universidades com 1,2 milhão de estudantes e 40 escolas técnicas de ensino médio e faculdades, os chamados Institutos Federais, ao mesmo tempo que insistia que a razão dos cortes era econômica e não política. Logo, milhares de pais começaram a se manifestar com seus filhos na frente dos Institutos Federais e esperando Bolsonaro em lugares de visita de sua agenda oficial, como durante a comemoração dos 130 anos do Colégio Militar do Rio de Janeiro.

Em cada uma dessas manifestações e depois nos protestos em massa de 15 de maio, os manifestantes levantaram uma série de questões, com cartazes opondo-se à proposta de Bolsonaro de militarizar escolas, sua guerra contra a ciência climática e seu corte pela metade do orçamento da ciência do país, o fim de regulamentações ambientais e trabalhistas e a contínua crise econômica brasileira – com o banco central dando sinais de uma nova recessão após uma contração de 0,1% do PIB no primeiro trimestre.

O mais significativo é que, enquanto os sindicatos, o PT e as organizações da pseudo-esquerda participaram de manifestações com cartazes “Lula Livre” – promovendo a mentira de que o ex-presidente do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, preso por corrupção, de alguma forma se oporia à austeridade –, protestos nos estados governados pelo PT também se opuseram aos seus governadores, com manifestantes na Bahia chamando Rui Costa de “Bolsonaro do PT”. O governo estadual do PT na Bahia fechou escolas com centenas de estudantes e cortou 28% do orçamento de 2018 das universidades estaduais. Manifestantes também lembraram que Costa, elogiado nas entrevistas de Lula como um “líder importante” na esquerda, regularmente minimiza os crimes policiais, tendo afirmado em 2015 que o policial “é como um artilheiro”, “aplaudido” se marcar e “condenado” se perder o gol.

Por sua vez, Bolsonaro reagiu com enorme hostilidade e agressividade às manifestações. Falando de Dallas, no Texas, onde ele estava para receber o título de “Personalidade do Ano” da Câmara de Comércio Brasil – EUA depois do Museu Americano de História Natural de Nova York ter se recusado a sediar o evento, o presidente chamou os manifestantes de “idiotas úteis” que estão sendo manipulados pelo PT.

Ele ainda tuitou um vídeo de 2010 de Lula usando as mesmas palavras de Weintraub para justificar cortes orçamentários do governo do PT, em que ex-presidente dizia que “Nós trabalhamos com a possibilidade de que vai melhorar a arrecadação e, melhorando a arrecadação, a gente vai repor e dar a possibilidade aos ministérios de gastar todo o dinheiro que foi disponibilizado.” Bolsonaro escreveu também no tuite que “Lula explica para a esquerda como funciona e quando é preciso o contingenciamento de recursos públicos (praticado por todos os governos). Agradeço a explanação!”

Bolsonaro está mergulhando rapidamente na mesma crise que atinge todos os setores do establishment político brasileiro, da qual sua eleição foi uma expressão distorcida.

O enorme tamanho e o alcance nacional das manifestações de15 de maio, assim como os protestos em desenvolvimento no norte da África, os protestos dos coletes amarelos na França, as greves de professores nos EUA e as manifestações da juventude contra a inércia capitalista sobre o aquecimento global, mostram que as massas do mundo estão claramente se movendo para a esquerda. Milhões de pessoas estão iniciando a luta contra o fracassado sistema capitalista, que incendiou tanto a catedral de Notre Dame quanto o Museu Nacional no Rio de Janeiro e é incompatível com os direitos mais básicos dos trabalhadores, do direito à educação e condições de vida decentes até a ameaça à própria vida do planeta.

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