Publicado originalmente em 13 de Junho de 2019
Entre os dias 6 e 8 de maio, foi realizado em Havana, Cuba, o “Evento Acadêmico Internacional Leon Trotsky”.
A realização dessa conferência em Cuba sobre Trotsky tem um significado inegável, uma vez que o Partido Comunista Cubano, o instrumento do governo nacionalista burguês longamente liderado por Fidel Castro e seu irmão, Raul, suprimiu o trotskismo e justificou os crimes da burocracia stalinista de Moscou contra o co-líder da Revolução Russa e fundador da Quarta Internacional.
Os trotskistas cubanos foram impiedosamente reprimidos pela liderança castrista, tendo sido presos e sua imprensa esmagada.
Assim que foi libertado de uma prisão mexicana em 1960, assassino de Trotsky e agente da GPU, a polícia secreta soviética, Ramon Mercader, voou para Cuba, onde foi saudado no aeroporto de Havana por Che Guevara e calorosamente recebido por Fidel Castro. Ele viajou regularmente entre Moscou e Havana, onde morreu em 1978.
Na década de 1960, sua mãe, Caridad Mercader, que desempenhou um importante papel na organização do assassinato de Trotsky, foi contratada pelo governo cubano como diretora de relações públicas em sua embaixada em Paris.
Em 1966, em um discurso proferido na Conferência Tricontinental em Havana, Fidel Castro violentamente atacou o trotskismo, descrevendo-o como “repugnante e nauseante” e “um instrumento vulgar do imperialismo e da reação”, ecoando a linguagem dos Processos de Moscou.
Apesar, ou mais provavelmente por causa, dessa campanha oficial do regime de Castro contra o trotskismo, há grande interesse entre o público cubano na vida e no legado de Leon Trotsky. Isso ficou evidente na popularidade do romance O Homem que Amava os Cachorros, do escritor cubano Leonardo Padura publicado em 2009, centrado no assassinato de Trotsky. Padura se inspirou para escrever o romance depois de visitar o museu Trotsky na Cidade do México e ver a sala onde Trotsky foi morto. Ele contou que retornou a Cuba e encontrou apenas dois livros na biblioteca sobre o líder revolucionário, Trotsky, o Renegado e Trotsky, o Traidor.
Esclarecer o papel de Trotsky e do trotskismo na manutenção da continuidade histórica da luta pelo internacionalismo socialista teria claramente um imenso significado político em Cuba. A classe trabalhadora cubana está enfrentando uma profunda crise social e econômica criada pela implacável pressão imperialista sobre a ilha e pela crescente desigualdade social criada pela tentativa do governo cubano de fortalecer seu governo por meio de acordos com o capital estrangeiro.
Esse não foi, no entanto, o objetivo da conferência em Havana. Com os temas e a lista de convidados aprovados pelas autoridades cubanas, o encontro não serviu para o esclarecimento político, pelo contrário. A conferência serviu aos interesses do governo em fornecer uma cobertura acadêmica inofensiva de esquerda enquanto a camada governante cubana se move cada vez mais para a direita.
O caráter da conferência foi determinado pelos convidados presentes e por aqueles que foram impedidos de participar.
O grupo de representantes da pseudo-esquerda e revisionistas pablistas que foi a Havana para apresentar-se tinha uma missão primordial: suprimir o conteúdo revolucionário do trotskismo e retratar o papel de Trotsky na história da maneira que o acomodasse aos interesses da elite governante de Cuba.
Apresentando-se como acadêmicos, seja com cargos docentes ou se autodenominando pesquisadores independentes, virtualmente todos os presentes são descendentes políticos daqueles que romperam com o movimento trotskista em 1963, capitulando ao nacionalismo pequeno-burguês e ao stalinismo, ao mesmo tempo que conduziam a liquidação da Quarta Internacional em todo o mundo.
Comitê Internacional da Quarta Internacional barrado
O Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI), que liderou a luta contra o liquidacionismo pablista, foi barrado da conferência por motivos completamente espúrios. Segundo os organizadores, o CIQI não poderia realizar uma apresentação nem comparecer ao evento, pois sua presença diminuiria a “capacidade de participação do público cubano, a quem o evento é dirigido”.
Como o organizador do evento foi obrigado a admitir no final da conferência, apenas um punhado de cubanos compareceu, entre os quais “observadores” enviados pelo governo para garantir que as discussões não se desviassem para áreas proibidas.
O governo cubano sabia muito bem quem estava convidando e quem estava excluindo. Estava totalmente consciente que, se os representantes do CIQI tivessem participado da conferência, teriam levantado as questões fundamentais colocadas pelo racha dentro do movimento trotskista de 1963 e as enormes diferenças sobre as implicações da Revolução Cubana.
O “Centro de Estudos Socialistas Carlos Marx”, uma frente da Corrente Marxista Internacional (CMI) liderada por Alan Woods, desempenhou papel central na organização do evento. O organizador cubano prestou uma homenagem especial ao “Centro”, e Woods realizou a declaração de encerramento por videoconferência direto de Londres.
Em seu relato sobre a conferência, a CMI incluiu a seguinte passagem reveladora: “As ideias de Leon Trotsky brilham com sua própria luz, mas não podemos dizer o mesmo de muitos que se autodenominam trotskistas, que são realmente grupos com uma mentalidade estreita e sectária. ... Havia um sério perigo de que o seminário saísse do controle, mas felizmente os organizadores lidaram com esses obstáculos corretamente.”
Claramente, o principal obstáculo foi a exclusão da conferência do Comitê Internacional da Quarta Internacional, que representa a continuidade da luta de Trotsky. Essa foi uma decisão tomada de maneira deliberada, desonesta e de má fé. Somente aqueles que estavam associados à capitulação revisionista pablista ao castrismo e ao stalinismo puderam comparecer.
A apresentação do próprio Woods em vídeo enfatizou o isolamento de Trotsky nos anos que antecederam seu assassinato, referindo-se a ele como “um homem contra o mundo”. Woods declarou que “as grandes ideias de Leon Trotsky continuam em nossas mentes, em nossos corações e em nossas almas”. Que Trotsky fundou a Quarta Internacional como o partido revolucionário mundial em sua luta contra o stalinismo foi totalmente ignorado.
As outras apresentações aderiram em grande parte a essa perspectiva. Susan Weissman, uma ex-pablista que faz parte dos Socialistas Democráticos dos EUA (DSA, na sigla em inglês), falou sobre Victor Serge, comparando-o favoravelmente a Trotsky, a quem ela retratou como irremediavelmente isolado e desligado do “intelecto geral” do bolchevismo durante sua luta para construir a Quarta Internacional.
Outros defenderam o argumento de que Trotsky cometera um erro político ao não se unir à oposição de direita de Bukharin contra Stalin, uma tendência nacionalista que refletia a influência do campesinato e a ameaça de restauração capitalista na União Soviética.
O papel de Ernest Tate
A apresentação do veterano pablista canadense, Ernest Tate, foi particularmente odiosa e reacionária. Tate é mais conhecido por uma provocação contra o Comitê Internacional em 1966 e Gerry Healy, então líder de sua seção britânica, a Liga Operária Socialista (Socialist Labour League – SLL).
Agindo como um agente do Secretariado Unificado pablista e do Partido Socialista dos Trabalhadores (Socialist Workers Party – SWP) dos EUA na Grã-Bretanha, Tate provocou um conflito do lado de fora de um encontro da SLL sobre os 10 anos da Revolução Húngara, quando foi pedido para que ele e outros que estavam vendendo literatura política desbloqueassem a entrada do encontro. Enquanto os outros desobstruíram a entrada, Tate se recusou e iniciou um confronto físico com os encarregados da SLL.
Imediatamente, Tate foi à imprensa da esquerda pequeno-burguesa na Inglaterra com uma versão mentirosa do incidente, denunciando a SLL como “violenta”, comparando Healy ao fascista inglês Oswald Mosley e alegando que ele e a SLL estavam suprimindo a liberdade de expressão.
Toda a provocação foi organizada em estreita cooperação com o SWP e o Secretariado Internacional com o objetivo de difamar o CIQI e a SLL e impedir qualquer discussão sobre as diferenças em relação a Cuba e ao liquidacionismo pablista.
Aqueles que publicaram a calúnia de Tate foram depois obrigados, sob a ameaça de uma ação legal, a publicar retratações e pedir desculpas por sugerirem que Healy e a SLL “empregam violência ou buscam restringir a liberdade de expressão”.
Tate ostensivamente falou em Cuba sobre a Teoria da Revolução Permanente de Trotsky. No entanto, ele conseguiu transformar a teoria de Trotsky, que coloca acima de tudo a necessidade de mobilização revolucionária independente da classe trabalhadora sob a liderança de um partido marxista internacional, em um manual para realizar campanhas de solidariedade em nome dos movimentos nacionalistas burgueses, com o castrismo em Cuba em primeiro lugar.
Tate cita de Trotsky o documento fundador da Quarta Internacional, “A Agonia Mortal do Capitalismo e as Tarefas da Classe Trabalhadora”, também conhecido como “O Programa de Transição”, como um exemplo do suposto foco da Teoria da Revolução Permanente na “solidariedade” com as lutas de libertação no mundo colonial.
Ele cita “O Programa de Transição”: “Mas nem todos os países do mundo são países imperialistas. Pelo contrário, a maioria é vítima do imperialismo. Alguns dos países coloniais ou semicoloniais tentarão, sem dúvida, se livrar do jugo da escravidão. Sua guerra não será imperialista, mas libertadora. Será o dever do proletariado internacional ajudar os países oprimidos na guerra contra os opressores”.
No entanto, Tate deliberadamente ignora o que se segue, que é a condição de que “Ao apoiar um país colonial… numa guerra, o proletariado não deve solidarizar-se, no que quer que seja, com o governo burguês do país colonial. ... Ajudando uma guerra justa e progressiva, o proletariado revolucionário conquista a simpatia dos trabalhadores das colônias ... e fortalece a autoridade e a influência da Quarta Internacional e aumenta sua capacidade de ajudar a derrubar o governo burguês no país colonial.”
Tate apresentou um relato mentiroso da importância do significado da Revolução Cubana na luta dentro da Quarta Internacional, exaltando o papel, em particular, de Joseph Hansen, agente e informante do FBI, em fazer da defesa de Cuba contra o imperialismo estadunidense a “prioridade política central” do SWP, então o partido trotskista nos Estados Unidos.
Ele também chamou a atenção para o envolvimento do SWP no Comitê para o Tratamento Justo de Cuba (Fair Play for Cuba Committee), uma notória frente da CIA, elogiando-o como “inteiramente no espírito da Teoria da Revolução Permanente de Trotsky” e “o modelo depois nas décadas dos anos sessenta e setenta para organizar o apoio aos povos do terceiro mundo... ”.
A apresentação de Tate teve o objetivo deliberado de ocultar do público cubano a luta que ocorreu dentro da Quarta Internacional sobre a Revolução Cubana. A chegada ao poder de Fidel Castro como resultado de uma guerra de guerrilha travada por um movimento nacionalista pequeno-burguês foi aproveitada pela liderança do SWP sob Hansen para a reunificação com os pablistas, com quem o SWP havia rompido uma década antes.
O objetivo dessa reunificação era dissolver a Quarta Internacional no pântano da política da esquerda de classe média. Os esforços para construir um movimento socialista internacional da classe trabalhadora, baseado na teoria marxista e guiado politicamente pela herança da luta de Trotsky contra a traição da Revolução de Outubro, seriam abandonados. O destino da revolução socialista deveria ser confiado a um conjunto de nacionalistas burgueses e organizações radicais pequeno-burguesas, aliadas ou dependentes, de uma forma ou de outra, da burocracia soviética.
Os pablistas proclamaram que a chegada ao poder de Castro à frente de um movimento guerrilheiro nacionalista havia aberto um novo caminho para o socialismo, que não exigia a construção de partidos marxistas revolucionários e a intervenção consciente e independente da classe trabalhadora.
Enquanto promovia uma defesa de princípios de Cuba contra a agressão imperialista, o CIQI baseou sua análise do castrismo em uma avaliação mais ampla do papel do nacionalismo burguês na época do imperialismo.
Cuba e a Teoria da Revolução Permanente
Cuba, como muitos outros países oprimidos após a Segunda Guerra Mundial, ofereceu uma confirmação da Revolução Permanente, mas negativamente. Ou seja, sob condições em que a classe trabalhadora carecia de um partido revolucionário e, portanto, era incapaz de liderar as massas de oprimidos, representantes da burguesia nacional e da pequena-burguesia foram capazes de impor sua própria solução contra a opressão imperialista. Nasser, Nehru, Peron, Ben Bella, Sukharno, os baathistas e, mais tarde, os fundamentalistas islâmicos no Irã e os sandinistas na Nicarágua, foram exemplos desse processo.
Em um documento enviado pela Liga Operária Socialista (SLL) ao SWP em 1961, os trotskistas britânicos criticaram duramente a adulação de Hansen das lideranças nacionalistas pequeno-burguesas.
Defendendo a Teoria da Revolução Permanente de Trotsky, a SLL escreveu: “Não é tarefa dos trotskistas impulsionar o papel de tais líderes nacionalistas. Eles possuem o apoio das massas apenas por causa da traição da liderança pela socialdemocracia e, em particular, pelo stalinismo, e, desta forma, eles se tornam intermediários entre o imperialismo e a massa de trabalhadores e camponeses. A possibilidade de ajuda econômica da União Soviética permite-lhes frequentemente negociar mais duramente com os imperialistas, permite até que elementos mais radicais entre os líderes burgueses e pequeno-burgueses ataquem as explorações imperialistas e obtenham mais apoio das massas. Mas, para nós, em todos os casos, a questão vital é que a classe trabalhadora desses países conquiste a independência política através de um partido marxista, liderando o campesinato pobre na construção de sovietes e reconhecendo as conexões necessárias com a revolução socialista internacional. Em nenhum caso, em nossa opinião, os trotskistas deveriam substituir isso pela esperança de que a liderança nacionalista se torne socialista. A emancipação da classe trabalhadora é tarefa dos próprios trabalhadores.”
No “Programa de Transição”, Trotsky havia antecipado a possibilidade de que “sob a influência de circunstâncias completamente excepcionais ... os partidos pequeno-burgueses, inclusive os stalinistas, possam ir mais longe do que queriam no caminho da ruptura com a burguesia.”
O documento fundador da Quarta Internacional continua insistindo que a tarefa de suas seções era “ajudar a luta dos trabalhadores por políticas independentes, aprofundar o caráter de classe dessas políticas, destruir as ilusões reformistas e pacifistas, fortalecer a conexão da vanguarda com as massas e preparar a conquista revolucionária do poder”.
Em relação a Cuba, os pablistas seguiram exatamente o caminho oposto, procurando semear ilusões na liderança nacionalista pequeno-burguesa de Fidel e subordinar os trabalhadores a ela.
O CIQI insistiu que o castrismo representava não um novo caminho para o socialismo, mas, sim, uma das variantes mais radicais do nacionalismo burguês, que havia chegado ao poder em muitos dos antigos países coloniais nos anos 1960. Muitos desses regimes realizaram amplas nacionalizações.
A proclamação pablista de Cuba como um “Estado operário” baseado nas nacionalizações realizadas sob o governo nacionalista pequeno-burguês de Fidel, que não envolveu a mobilização independente da classe trabalhadora e nenhuma forma de controle operário sobre as indústrias nacionalizadas, era completamente oposta ao marxismo.
Duas décadas antes da Revolução Cubana, Trotsky rejeitara explicitamente a identificação superficial de nacionalizações empreendidas por forças pequeno-burguesas com a revolução socialista. Em resposta às expropriações realizadas pela burocracia stalinista do Kremlin durante sua invasão da Polônia (em aliança com Hitler) em 1939, Trotsky escreveu: “O principal critério político para nós não é a transformação da propriedade nesta ou em outra área, por mais importantes que sejam em si mesmas, mas, sim, a mudança na consciência e organização do proletariado mundial, a elevação de sua capacidade de defender as conquistas anteriores e realizar novas”.
Ao combater a perspectiva pablista, o Comitê Internacional advertiu que sua rejeição do papel central e principal da classe trabalhadora na revolução socialista e da necessidade de construir um partido trotskista para desenvolver dentro da classe trabalhadora a consciência necessária para a conquista do poder político, só poderia levar a novas traições. Se tal partido não era necessário em Cuba, como os pablistas afirmavam, por que seria necessário em qualquer outro lugar do mundo?
Baseando-se na Teoria da Revolução Permanente de Trotsky, o Comitê Internacional insistiu que a luta pela libertação da opressão imperialista nos países coloniais e ex-coloniais só poderia ser realizada sob a liderança da classe trabalhadora, sua conquista do poder e a extensão da revolução internacionalmente. A principal tarefa que decorre dessa perspectiva é a de construir partidos revolucionários independentes da classe trabalhadora em uma luta implacável para romper com todas as tendências que procuram subordinar os trabalhadores ao nacionalismo burguês.
O castrismo como um “novo caminho para o socialismo”: um balanço
As advertências feitas pelo Comitê Internacional foram tragicamente confirmadas, uma vez que o castrismo foi proclamado o novo modelo para a revolução socialista, com consequências catastróficas em toda a América Latina. Os pablistas instruíram seus próprios seguidores na região a abandonar a luta pela liderança revolucionária na classe trabalhadora e, em vez disso, lançarem-se em “preparações técnicas” para a “luta armada” no campo.
Quais foram os resultados dessa perspectiva? As seções mais radicalizadas da juventude, bem como os trabalhadores mais jovens, foram desviados da luta pela liderança revolucionária na classe trabalhadora, ajudando a consolidar o controle contrarrevolucionário das burocracias stalinistas, socialdemocratas e nacionalistas burguesas. Esses próprios jovens foram lançados em combates suicidas com as forças militares dos estados capitalistas da América Latina, levando à morte de milhares de pessoas. E as fracassadas aventuras guerrilheiras foram invocadas pelos militares em um país após o outro como pretexto para impor ditaduras fascistas-militares e a repressão generalizada das massas trabalhadoras.
O destino de Che Guevara, que embarcou em sua aventura fatal na Bolívia, onde foi capturado e executado em outubro de 1967, foi uma trágica antecipação das consequências desastrosas do castrismo e do revisionismo pablista.
O governo de Castro, longe de fornecer um novo caminho para o socialismo, sustentou-se como um cliente do bloco soviético, ao mesmo tempo que forjou laços pragmáticos com os mesmos governos burgueses da América Latina contra os quais aqueles que adotaram a doutrina guerrilheira de Guevara estavam tentando derrubar. No Chile, Castro exaltou a “via parlamentar ao socialismo”, dizendo aos trabalhadores para se subordinarem ao governo de Allende, enquanto os militares preparavam seu golpe. Ele adotou regimes militares no Equador e no Peru e estabeleceu laços estreitos com o aparato corrupto do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que governava o México, imediatamente após ele ter massacrado os protestos estudantis de 1968.
Sem o conhecimento dessas experiências estratégicas decisivas e da luta que se desenrolou dentro da Quarta Internacional, é impossível entender a crise de hoje, não apenas em Cuba, mas em toda a América Latina.
Tate, no entanto, passa por tudo isso em silêncio, reduzindo a questão de Cuba e da Quarta Internacional a campanhas de solidariedade radicais pequeno-burguesas.
O que ele escolhe como modelo para essas operações – Hansen e o Comitê para o Tratamento Justo de Cuba – é altamente revelador.
A investigação das circunstâncias em torno do assassinato de Leon Trotsky em 1940, conduzida pelo Comitê Internacional da Quarta Internacional, que foi chamada “Segurança e a Quarta Internacional”, revelou os esforços de décadas das agências policiais do imperialismo e do stalinismo para penetrar e sabotar a Quarta Internacional. Entre outras coisas, a investigação revelou evidências conclusivas de que Joseph Hansen havia atuado como um agente do Estado dentro do movimento trotskista.
Quanto ao Comitê para o Tratamento Justo de Cuba (FPCC, na sigla em inglês), Tate ignora o papel sinistro que ele desempenhou na trajetória política do SWP. O co-fundador do comitê foi Alan Sagner, uma figura do establishment que se tornaria membro do Comitê Nacional do Partido Democrata, presidente da Autoridade Portuária de Nova York e Nova Jersey e presidente da Corporação de Radiodifusão Pública, bem como membro do conselho de Executivos de Negócios para a Segurança Nacional.
O FPCC foi inundado e manipulado por agentes do FBI e informantes. Ele serviu de ligação entre o SWP e um grupo de 12 estudantes da Carleton College, uma pequena faculdade de artes liberais em Minnesota, onde o SWP não havia realizado nenhum trabalho. Liderado por Jack Barnes (um republicano que viajou para Cuba com uma bolsa da Fundação Ford), esse grupo assumiu a liderança do partido – formando a maioria de seu comitê político – e expulsou centenas de veteranos do SWP.
Ao apresentar essa história de traições do revisionismo pablista como a realização da Teoria da Revolução Permanente, Tate procurou deliberadamente afastar do público cubano o legado revolucionário de Trotsky e sua continuidade na luta da Quarta Internacional.
Tate não se incomodou em explicar ao seu público o que aconteceu com o Grupo Marxista Internacional (International Marxist Group – IMG), com o qual ele era afiliado e cuja política no Reino Unido ele elogiou em sua apresentação. Tendo encenado uma provocação policial após a outra, o IMG se liquidou em 1981, tentando entrar no Partido Trabalhista que se movia para a direita.
Também digna de nota foi a presença na conferência de um representante do Partido Revolucionário dos Trabalhadores (Devrimci İşçi Partisi – DİP) da Turquia, que, em sua apresentação, revelou estar pisando em um “Estado operário” e saudou Che Guevara como o mais destacado representante da Teoria da Revolução Permanente de Trotsky.
O DİP, juntamente com o argentino Partido Obrero (PO), de Jorge Altamira, e o grego EEK (Partido Revolucionário dos Trabalhadores), de Savas Michael-Matsas, faz parte do Comitê Coordenador para a Refundação da Quarta Internacional (CRQI), que tem atuado para “refundar” a Quarta Internacional em aliança com o stalinismo. Parece que esse empreendimento reacionário agora se estende ao governo castrista em Cuba.
Nenhuma dessas tendências nem seus representantes, que foram a Havana para fazer apresentações denegrindo o legado histórico do co-líder da Revolução Russa e fundador da Quarta Internacional e enterrando a luta do movimento trotskista, se preocuparam em fazer qualquer balanço da Revolução Cubana, muito menos de seu próprio histórico em proclamar Castro como “marxista natural”, Cuba como “Estado operário” e o movimento guerrilheiro pequeno-burguês como um novo caminho para o socialismo.
A crítica feita pelo Comitê Internacional da Quarta Internacional a essas formas de adaptação ao castrismo foi completamente confirmada.
Longe de proporcionar um novo caminho para o socialismo, o movimento castrista se mostrou incapaz de resolver os problemas históricos fundamentais da sociedade cubana. Seis décadas após Castro ter chegado ao poder, a economia da ilha continua cada vez mais dependente do turismo e do dinheiro enviado por emigrantes. O fim dos subsídios soviéticos após a dissolução da URSS pela burocracia stalinista em 1991 e a forte redução das importações de petróleo de uma Venezuela em crise revelaram o atraso e a dependência da economia da ilha, enquanto milhões de trabalhadores cubanos estão condenados à pobreza.
Sessenta anos após a chegada de Castro ao poder, não há organizações independentes da classe trabalhadora cubana, muito menos órgãos de governo. Depois da morte de Fidel Castro em 2016, seu irmão, Raul, de 88 anos, continua sendo o líder do partido governante do país.
Não há dúvida de que o interesse popular em Leon Trotsky crescerá em Cuba à medida que as massas de trabalhadores passem a enfrentar a ameaça de guerra, ao mesmo tempo que aumentam os ataques a seus padrões de vida e a desigualdade social cresce, enquanto a classe governante tenta salvar seus privilégios através de laços cada vez mais estreitos com o capital externo. As tentativas dos pablistas de retratar Cuba como um “Estado operário” foram amplamente expostas à medida que o capitalismo domina com mais clareza a economia do país.
Os trabalhadores cubanos encontrarão um caminho para uma compreensão genuína da luta de Trotsky apenas se familiarizando com sua continuidade na luta do Comitê Internacional da Quarta Internacional para defender o programa e a perspectiva do internacionalismo revolucionário socialista contra todos os seus opositores revisionistas.
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[16 de Setembro de 2008]