Publicado originalmente em 24 de fevereiro de 2023
Em 25 de fevereiro, às 15h (horário de Brasília), o World Socialist Web Site e a Juventude e Estudantes Internacionais pela Igualdade Social irão realizar uma discussão online intitulada “Como acabar com a guerra na Ucrânia”. Inscreva-se e participe do evento clicando aqui.
Hoje faz um ano da invasão russa da Ucrânia de 24 de fevereiro de 2022. A guerra, instigada pela expansão implacável da OTAN e pelos interesses geopolíticos e econômicos globais do imperialismo americano e europeu, está escalando em direção a uma Terceira Guerra Mundial com consequências potencialmente catastróficas.
Nas etapas iniciais de praticamente todas as guerras, os governos alegam estar agindo em legítima defesa e focam a atenção na questão de quem disparou o “primeiro tiro”. Depois, segue-se uma propaganda atroz e implacável com o objetivo de demonizar o inimigo. No entanto, inevitavelmente, à medida que as baixas se acumulam e as expectativas iniciais de ambos os lados são frustradas, as causas mais profundas e os fatores que impulsionaram a guerra são revelados. Isso aconteceu na guerra na Ucrânia.
Ao iniciar seu segundo ano, o conflito evoluiu para uma guerra do imperialismo americano e europeu, com seus satélites da OTAN, contra a Rússia. As mentiras estão sendo expostas. A guerra não é sobre a defesa da Ucrânia, muito menos sobre a defesa de uma “democracia” ucraniana que não existe. É, sim, uma guerra imperialista, que tem como objetivo a derrota militar da Rússia, a destituição de seu governo e a imposição de um regime fantoche. Tal resultado visa colocar os vastos recursos naturais da Rússia sob o controle direto das corporações americanas e europeias, estabelecer o domínio do imperialismo americano sobre a massa terrestre eurasiática e abrir o caminho para a guerra com a China.
Na busca desses objetivos, os EUA e a OTAN estão cruzando todas as suas “linhas vermelhas” anteriormente delimitadas. Apenas nos dois primeiros meses de 2023, os EUA e as potências europeias anunciaram o envio ou planejaram enviar tanques, mísseis de longo alcance e caças para a Ucrânia.
Em sua viagem a Kiev e Varsóvia esta semana, Biden reiterou que o objetivo da guerra é a derrota estratégica da Rússia. O governo dos EUA não tem interesse em negociar um cessar-fogo e no fim do conflito em termos que concedam qualquer coisa à Rússia. O governo Biden criou uma situação em que não pode haver recuo, pois fazê-lo prejudicaria irreparavelmente seu prestígio e credibilidade, e levaria à ruptura da OTAN. A vitória nesta guerra se tornou uma questão existencial para o imperialismo americano.
A situação para as massas ucranianas, que são vistas como dispensáveis, é profundamente trágica. Apesar de todas as alegações de que estão ocorrendo grandes avanços pela Ucrânia no campo de batalha, a população do estado vassalo está abandonada. Enquanto a mídia americana se vangloria, sem provas claras, de grandes baixas russas, há um silêncio quase total sobre a escala terrível das perdas ucranianas. Há relatos confiáveis que apontam para entre 150.000 e 200.000 de soldados ucranianos mortos. Uma geração de jovens ucranianos está sendo sacrificada pelos neoconservadores belicistas no governo Biden.
E apesar de todos os esforços de propaganda para glorificar o regime ucraniano, o ex-comediante Zelensky não passa de um homem de fachada para os oligarcas corruptos que controlam o país e para os neonazistas que estão entrincheirados dentro do exército. Sem a infusão maciça de dinheiro e armamentos, o regime não sobreviveria mais uma semana.
Os incessantes apelos para o envio de armas mais avançadas refletem o crescente temor de que a esperada ofensiva russa resulte no colapso total do exército e do regime ucraniano. A situação que a Ucrânia enfrenta não pode ser resolvida apenas com tanques e caças. O destacamento de tropas da OTAN é necessário. O objetivo da visita de Biden era superar as divisões dentro da OTAN e preparar a opinião pública para esse próximo passo.
Como sempre, as ações do imperialismo são justificadas com mentiras e hipocrisia. Em seu discurso em Varsóvia, Biden declarou que “em jogo neste conflito” está “a liberdade das democracias em todo o mundo”. Ele proferiu esse discurso diante de uma reunião dos membros do Leste Europeu da OTAN, todos eles dominados por governos de direita e autoritários.
O fato de que o regime ucraniano e suas forças militares estão saturadas de neofascistas é indiscutível. A história da Ucrânia está sendo reescrita com base em uma narrativa que promove como herói nacional Stepan Bandera, o assassino em massa fascista e aliado do Terceiro Reich que liderou a notória Organização dos Nacionalistas Ucranianos.
O governo da Polônia, que convidou Biden a proferir seu discurso, é controlado pelo Partido Lei e Justiça de extrema-direita, que criminalizou o discurso e a pesquisa histórica sobre o antissemitismo polonês, ao mesmo tempo em que transformou a Polônia em uma ponta de lança para a agressão dos EUA contra a Rússia. Em uma entrevista ao Haaretz esta semana, o ex-presidente polonês Lech Walesa observou que o estado da democracia na Polônia é tão grave que exigiria uma “revolução nas ruas com o uso da força... É até onde o Partido Lei e Justiça foi na destruição da democracia e da liberdade”.
O Wall Street Journal, o jornal da oligarquia financeira americana, expôs os verdadeiros problemas em um editorial desta semana (“A Escolha dos EUA na Ucrânia”). “O caminho mais rápido para a paz”, declarou o jornal, “é a derrota do Sr. Putin...”. Ciente da ausência de apoio popular à guerra, o Wall Street Journal aconselha o governo Biden a “falar mais diretamente com os americanos que estão cada vez mais céticos sobre o que está em jogo na Ucrânia, e fundamentar o apoio deles aos EUA em interesses nacionais centrais, não em voos wilsonianos sobre ‘soberania’ estrangeira e democracia”.
Toda a discussão sobre a guerra na mídia americana e europeia se baseia na narrativa de propaganda de uma “guerra não provocada”, desencadeada sem motivo pelo diabólico Vladimir Putin. Tudo o que ocorreu nos anos e décadas antes de 24 de fevereiro de 2022 é simplesmente ignorado. Esta guerra, ao contrário de qualquer outra, não possui causalidade histórica.
Na verdade, o conflito com a Rússia é a continuação de uma série interminável de guerras e intervenções lançadas pelo imperialismo americano desde a dissolução da União Soviética em 1991. Diante do prolongado declínio de sua posição econômica global, incluindo as crescentes ameaças à posição do dólar como moeda de reserva mundial, e atormentado pela crise interna, os Estados Unidos enxergam em seu poder militar o meio de manter sua posição hegemônica global.
O conflito com a Rússia foi desencadeado pela expansão de décadas da OTAN até as fronteiras da Rússia. Em 2014, os EUA lideraram um golpe de direita na Ucrânia para derrubar um governo pró-russo, que iniciou a guerra civil de oito anos no Leste. Nos oito anos anteriores à invasão russa, a Ucrânia estava sendo armada até os dentes com dezenas de bilhões de dólares em equipamentos militares, transformando-a em um membro de fato da aliança militar da OTAN.
Por parte da Rússia, a decisão de lançar a “Operação Militar Especial” há um ano foi uma resposta desesperada e reacionária às consequências catastróficas da dissolução da URSS pela burocracia stalinista, da restauração do capitalismo e da criação de um regime oligárquico baseado no roubo e privatização de bens estatais.
Os interesses pelos quais o governo Putin está lutando não são os das massas russas, mas da classe dominante capitalista. Ele lançou a invasão com a esperança de que pudesse chegar a um acordo de compromisso com os Estados Unidos, incluindo o reconhecimento dos “interesses de segurança” do Estado russo, e que permitiria à oligarquia russa saquear os recursos da Rússia sem a interferência direta das potências imperialistas.
Putin está tentando fomentar apoio para a guerra incitando o chauvinismo nacional reacionário. Mas a guerra é profundamente impopular dentro da classe trabalhadora e de amplos setores da juventude.
Há uma consciência generalizada e crescente de que a guerra é o resultado da dissolução da URSS e da restauração do capitalismo.
Sentimentos semelhantes existem entre as massas de ucranianos, que foram arrastados para esta guerra pela venal classe dominante.
A resposta a esta guerra não está na vitória militar de nenhum dos lados, mas em uma luta unificada da classe trabalhadora russa e ucraniana contra o imperialismo e todos os governos burgueses.
Os objetivos do imperialismo americano e europeu implicam que nenhuma solução para o conflito é aceitável, exceto a derrota militar da Rússia. E, além da Rússia, o imperialismo americano já está preparando o conflito com a China, que os generais americanos preveem que irá acontecer dentro dos próximos três anos.
Os governos são indiferentes ao impacto de suas políticas sobre as massas da população. Durante os agora três anos da pandemia de COVID-19, a classe dominante implementou uma política que levou à morte de mais de 22 milhões de pessoas. Os EUA e as potências da OTAN responderam ao catastrófico terremoto na Turquia e na Síria, que matou até 150.000 pessoas, com um recuo coletivo, como uma breve interrupção da tarefa em mãos: a escalada da guerra.
Mas as mesmas contradições que produzem a guerra imperialista também produzem a base objetiva para a revolução social. A Primeira Guerra Mundial criou as condições para a Revolução Russa de Outubro de 1917, assim como terminou por causa dela. Hoje, mesmo quando a classe dominante está tentando arrastar a humanidade para a Terceira Guerra Mundial, lutas revolucionárias estão entrando em erupção em todo o mundo.
Na França, milhões de trabalhadores têm participado de manifestações em massa contra o ataque do governo Macron às aposentadorias. No Reino Unido, centenas de milhares de trabalhadores realizaram inúmeras greves, apesar dos esforços do aparato sindical para conter e reprimir a oposição. No Sri Lanka, dezenas de milhares se manifestaram contra as medidas de austeridade apoiadas pelo FMI que estão sendo implementadas pelo presidente Ranil Wickremesinghe, que chegou ao poder após os protestos em massa do ano passado terem forçado a destituição do odiado regime de Gotabaya Rajapakse.
Os próprios Estados Unidos são um barril de pólvora social. A desigualdade social está em níveis não vistos desde os anos que precederam a Grande Depressão dos anos 1930. A subordinação de toda a vida social e econômica à mania especulativa de Wall Street e à política de guerra da classe dominante levou à destruição da infraestrutura social, revelada no catastrófico descarrilamento ferroviário e na poluição ambiental deste mês em Ohio.
A construção de um movimento contra a guerra depende de uma correta identificação de suas causas fundamentais e dos interesses sociais que a impulsionam. Ela deve ser direcionada para mobilizar a força social que pode acabar com a guerra, a classe trabalhadora internacional.
Trabalhadores e jovens de todo o mundo devem rejeitar o falso e reacionário movimento “antiguerra” que está sendo promovido por setores da classe média com base em uma reacionária “aliança entre esquerda e direita” de liberais de classe média desmoralizados e radicais desorientados com abertos fascistas.
No comício “Rage Against the War Machine” (“Fúria Contra a Máquina de Guerra”) organizado no último fim de semana, manifestantes que afirmam estar à esquerda se uniram aos libertários e forças fascistas e antissemitas, alegando que somente com tal aliança a marcha rumo à Terceira Guerra Mundial pode ser interrompida. Coalizões similares estão sendo promovidas internacionalmente, inclusive por Sahra Wagenknecht, do Partido A Esquerda na Alemanha, que tem trabalhado para cerrar fileiras com o partido fascista Alternativa para a Alemanha (AfD).
Essa “coalizão entre esquerda e direita” nada tem a ver com a oposição ao imperialismo, mas serve apenas para desorientar e bloquear o desenvolvimento de um movimento socialista antiguerra baseado na classe trabalhadora.
Em última análise, a oposição declarada da extrema direita à guerra dos EUA e da OTAN contra a Rússia está ligada a divisões dentro da classe dominante sobre a direção a seguir da política externa.
Deve-se lembrar que, nos anos que antecederam a Segunda Guerra Mundial, tais tendências reacionárias foram apresentadas como supostas defensoras da paz. Nos Estados Unidos, ela foi associada ao movimento “America First” (“EUA em Primeiro Lugar”), do simpatizante nazista Charles Lindbergh, que se opôs às políticas de Roosevelt não numa base anti-imperialista, mas a partir do nacionalismo reacionário e do antissemitismo. Na Inglaterra, essa tendência foi associada a Oswald Mosely, que fundou a União Britânica dos Fascistas.
Opondo-se àqueles que justificavam uma aliança com os isolacionistas de direita e o fascista Lindbergh a fim de impedir a entrada dos Estados Unidos na guerra que tinha eclodido em 1939, o Militant, publicação dos trotskistas americanos, advertiu em setembro de 1941:
As massas odeiam a guerra imperialista e encaram o programa de guerra de Roosevelt com desconfiança, e justificadamente. Mas elas não podem obter a resposta para os belicistas dos isolacionistas.
Pois os isolacionistas não lideram uma luta contra a verdadeira causa da guerra. De fato, eles servem apenas para desviar a atenção da verdadeira causa da guerra, que deve ser totalmente compreendida antes que a guerra possa ser combatida com sucesso. …
Eles podem enfurecer e despertar elementos retrógrados e estreitos contra os belicistas com tal propaganda, mas nunca podem mobilizá-los para evitar ou acabar com a guerra dessa forma.
A única resposta à guerra é o internacionalismo revolucionário, que prega uma destruição da causa da guerra, o sistema capitalista.
A advertência emitida pelos trotskistas em 1941 mantém todo o seu significado. A política que afirma que a luta contra a guerra justifica uma aliança com os fascistas só pode resultar na guerra e no fascismo.
A premissa essencial para uma luta contra a guerra é a compreensão de suas causas. Toda a discussão sobre a oposição à guerra que evita os temas do capitalismo e da luta de classes é uma perda de tempo.
A construção de um movimento contra a guerra e o imperialismo, que está arrastando a humanidade para o apocalipse da guerra nuclear, requer a construção de um movimento socialista, revolucionário e internacionalista da classe trabalhadora. Requer também ligar a luta contra a guerra e a luta contra a exploração, a desigualdade e o sistema de lucro capitalista.
No segundo ano da guerra na Ucrânia, o crescente movimento de trabalhadores em todo o mundo deve se desenvolver como um movimento político consciente pelo socialismo. Esse é o programa antiguerra pelo qual o Comitê Internacional da Quarta Internacional e seus Partidos Socialistas pela Igualdade estão lutando.
Em 25 de fevereiro, às 15h (horário de Brasília), o World Socialist Web Site e a Juventude e Estudantes Internacionais pela Igualdade Social irão realizaruma discussão online intitulada “Como acabar com a guerra na Ucrânia”. Inscreva-se e participe do evento clicando aqui.