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PT encobre colaboração na política de “imunidade de rebanho” de Bolsonaro durante campanha eleitoral

Publicado originalmente em 23 de setembro de 2022

A pouco mais de uma semana da eleição presidencial de 2 de outubro no Brasil, o Partido dos Trabalhadores (PT) e seu candidato, Luiz Inácio Lula da Silva, estão tentando esconder a situação apodrecida da democracia burguesa brasileira, que inclui ameaças de o presidente fascistoide Jair Bolsonaro repetir o 6 de janeiro nos EUA e realizar um golpe eleitoral caso não seja eleito. Como acontece em todas as eleições burguesas, o total encobrimento da real situação política, econômica e social, assim como suas causas, se soma a inúmeras falsas promessas.

O tema central da campanha eleitoral do PT e de Lula é que irão “reconstruir e transformar” o Brasil se eleitos com base em um programa nacionalista e pró-corporativo. Eles esperam recuperar o papel do PT como o partido de governo preferido da burguesia nacional, conquistando ao mesmo tempo apoio internacional.

Um elemento-chave de seu conjunto de promessas cada vez menores é que o partido adotará uma abordagem oposta à de Bolsonaro e cientificamente orientada à saúde pública, fortalecendo o Sistema Único de Saúde (SUS). O partido finge se horrorizar com a política homicida de “imunidade de rebanho” de Bolsonaro, que levou a quase 700.000 mortes oficiais por COVID-19 no Brasil. Denunciar a resposta de Bolsonaro à pandemia de “genocida” se transformou em um dos principais elementos da campanha eleitoral de do PT durante a campanha eleitoral.

Entretanto, qualquer pretensão que o PT tenha representado nos últimos três anos ou venha a representar no futuro uma alternativa à bárbara política de Bolsonaro em relação à pandemia é exposta por suas próprias declarações sobre o assunto.

Em uma propaganda eleitoral sobre a política do governo Bolsonaro diante da pandemia, o PT diz que “Bolsonaro debochou da pandemia que matou 670 mil brasileiros. 400 mil vidas poderiam ter sido salvas”. O PT considera que 270 mil mortes são aceitáveis e eram inevitáveis, e nem de longe faz referência à possibilidade de a COVID-19 ser eliminada. Se o Brasil tivesse seguido uma política de COVID Zero tal como a implementada na China, teriam sido registradas menos de 800 mortes ao longo de toda a pandemia.

Dos 121 parágrafos do plano de governo da chapa eleitoral encabeçada pelo PT, apenas um trata da pandemia de COVID-19. Segundo ele, “É urgente ... atender as pessoas com sequelas da covid-19 e retomar o reconhecido programa nacional de vacinação”. Isso representa uma total minimização do perigo ainda colocado pela pandemia no Brasil, desconsidera a possiblidade de a situação se agravar com novas variantes e expressa sua defesa da alegação sem base científica que apenas a vacinação pode conter a pandemia, o que expressa o alinhamento de classe do PT e dos outros partidos de sua coligação, que inclui o pseudoesquerdista Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), à política da elite dominante mundial, liderada pelo governo Biden nos EUA, ao considerar que a COVID-19 se tornou “endêmica”, o que só interessa às grandes corporações.

A oposição fraudulenta dos sindicatos e governadores do PT a Bolsonaro

A pandemia de COVID-19 impulsionou ainda mais a aproximação do PT com setores da classe dominante brasileira preocupados que a maneira sincera e cruel com que Bolsonaro defendia a ofensiva contra a saúde e as condições de vida dos trabalhadores poderia ameaçar o país com uma explosão social, colocando em questão a própria continuidade do capitalismo.

Isso foi exposto particularmente nos estados do Nordeste – quatro deles governados pelo PT e três pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que está na chapa do PT com o candidato a vice-presidente –, que no início da pandemia criaram um comitê científico para guiar o combate à pandemia supostamente com base na ciência, com o fechamento de escolas e dos negócios em geral. Qualquer pretensão de que isso iria acontecer caiu por terra menos de um ano depois, quando o renomado neurocientista Miguel Nicolelis, ele próprio um apoiador do PT de longa-data, deixou a coordenação do comitê logo antes da segunda onda explodir no Brasil, no início de março de 2021.

Ao contrário da propaganda da imprensa de que as pessoas estavam “cansadas” e se opunham às medidas de isolamento social, elas foram cruciais para os ganhos eleitorais do PT nas eleições municipais de novembro de 2020. Mas como Nicolelis explicou em uma entrevista ao WSWS em outubro de 2021: “Na primeira onda, ... conseguimos achatar a curva com isolamento social e alguns lockdowns regionais, principalmente no Nordeste ... Mas depois que o calendário eleitoral foi resolvido [em novembro de 2020], e era nisso que aparentemente eles [os governadores do Nordeste] estavam interessados, pararam. Porque na segunda onda eles não fizeram nada.”

Depois, durante o pico da onda da Ômicron BA.1 no início deste ano, Nicolelis voltou a denunciar a política do PT em outra entrevista ao WSWS, dizendo: “os próprios governadores do PT, que eu conheço muito bem porque trabalhei com eles, deixaram de fazer o que tinha que ser feito há muito tempo. Então, quem é progressista nessa história? Eu vi condutas de gente chamada de progressista que eram muito parecidas com a do Bolsonaro. Só tinham o verniz e a chancela de progressista.”

Crucial para a oposição fraudulenta do PT a Bolsonaro era a afirmação de que vacinas sozinhas poderiam conter o vírus. No início de março de 2021, quando a segunda onda explodiu no Brasil depois de inúmeros alertas que especialistas vinham realizando desde o início daquele ano, os governadores anunciaram um suposto “pacto nacional” contra a pandemia, que se resumia a acelerar a compra de vacinas e implementar inefetivos “toques de recolher”, com a proibição de circulação em determinados horários.

O PT tomou para si a política de “imunidade de rebanho” em agosto. Com o número de mortes da segunda onda diminuindo a partir de junho de 2021, ainda assim com mais de mil vítimas da COVID-19 todos os dias, os governadores estaduais aproveitaram o início do segundo semestre letivo e realizaram em agosto a maior reabertura de escolas no Brasil desde o início da pandemia. No estado da Bahia, o governador do PT, Rui Costa, cortou os salários dos professores em greve contra a reabertura das escolas e ameaçou demiti-los.

Em outubro de 2021, depois de derrubar o distanciamento social nas salas de aula, três dos quatro governadores estaduais do PT tinham tornado a presença dos alunos obrigatória nas escolas inseguras. Como a presença dos alunos nas escolas era um pressuposto para a reabertura geral da economia, os estados governados pelo PT tinham também eliminado praticamente todas as restrições aos negócios.

Com o abandono do uso de máscaras nas escolas de todos os estados brasileiros em abril deste ano depois da onda da Ômicron BA.1, a presença de crianças desprotegidas em escolas precárias encontrou um ambiente propício para a proliferação de uma série de doenças infecciosas, como a bronquiolite aguda, que lotou UTIs pediátricas de vários estados e levou a dezenas de mortes. Entre janeiro e maio deste ano, quase 300 crianças de até quatro anos morreram infectadas pela assim chamada “leve” Ômicron BA.1, o dobro do que no mesmo período do ano passado. Em maio, no início da onda impulsionada pela Ômicron BA.4/5, mais da metade dos casos de COVID no Ceará, um dos estados governados pelo PT, aconteceram em crianças de até 9 anos de idade.

A partir de 29 de maio de 2021, manifestações de massas lideradas pela juventude brasileira estouraram contra a política de imunidade de rebanho de Bolsonaro. Diante das maiores manifestações durante a pandemia no Brasil, o PT, o PSOL e todos os outros partidos da pseudoesquerda, aterrorizados com a possibilidade de serem ultrapassados pelas manifestações, redobraram seus esforços para canalizar a oposição por trás de um “super pedido” de impeachment de Bolsonaro, que contou com o apoio de representantes da direita e da extrema direita brasileiras, muitos deles antigos aliados de Bolsonaro que tentavam se distanciar do presidente fascistoide.

A participação de odiados opositores de direita a Bolsonaro nas manifestações também foi apoiada abertamente pelo PT e pelo PSOL, com o presidente do PSOL, Juliano Medeiros, tendo declarado meses antes que “para que o impeachment avance, é preciso que parte da centro-direita rompa com o governo.” Logo, todas as manifestações foram desmobilizadas com base em vãs esperanças de que a Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado brasileiro investigando as ações do governo Bolsonaro durante a pandemia daria o “empurrão final” para o impeachment, o que nunca aconteceu.

A CUT, a maior central sindical brasileira e controlada pelo PT, cumpriu um papel central nesse processo ao iniciar uma série de reuniões ao lado de outras centrais sindicais com o ex-governador de São Paulo, João Doria (PSDB), para garantir que as fábricas no estado mais industrializado do Brasil não fossem fechadas. Como consequência, Doria flexibilizou o horário dos turnos das fábricas como parte do fraudulento “toque de recolher” de seu governo.

Também desempenhou um papel central o sindicato dos professores da rede pública estadualde São Paulo dirigido pelo PT, a APEOESP, que de maneira criminosa sabotou uma greve contra a reabertura de escolas no início do ano letivo de 2021, um mês antes da segunda onda explodir em março.

Todas essas manobras que reproduziram localmente a política de “imunidade de rebanho” de Bolsonaro renderam ao PT bons frutos políticos. Ele conseguiu formar a maior coligação eleitoral desta eleição presidencial, que passou de 3 partidos em 2018 para 9 hoje. Entre os partidos e figuras políticas nesta coligação estão aqueles denunciados recentemente como “golpistas” pelo PT por terem apoiado o impeachment fraudulento da presidente Dilma Rousseff, principalmente o ex-governador de São Paulo por 14 anos, Geraldo Alkmin, que deixou o PSDB no ano passado e foi para o PSB para se tornar o candidato a vice-presidente na chapa de Lula.

A necessidade da eliminação global da COVID-19 e a luta pelo socialismo

Desde o início, o Comitê Internacional da Quarta Internacional insistiu que a pandemia de COVID-19 não era apenas um problema sanitário, mas predominantemente político. A resposta a ela tem sido determinada por definidos interesses de classe.

Os desenvolvimentos nos últimos três anos têm mostrado que não há diferenças qualitativas entre o governo Bolsonaro e o PT, a pseudoesquerda e os sindicatos em relação à pandemia. Ao priorizar os interesses de lucro corporativo, eles foram fundamentais para manter negócios e escolas abertas ao longo da pandemia, seja eliminando as poucas políticas de mitigação e criando a falsa ilusão que a pandemia está no fim, ou bloqueando o desenvolvimento da oposição social.

A única resposta cientificamente fundamentada à pandemia e que representa os interesses dos trabalhadores é a eliminação global da COVID-19. Isso requer uma ruptura consciente com o PT, a pseudoesquerda e os sindicatos que ignoraram completamente a necessidade de a COVID-19 ser eliminada, e o desenvolvimento de uma luta contra a origem da política de imunidade da elite capitalista mundial, o sistema capitalista. O movimento crescente da classe trabalhadora brasileira e internacional deve levantar essa bandeira para colocar um fim à pandemia como parte de uma luta mais ampla pelo socialismo internacionalista.

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